Wednesday, December 31, 2008

Sobre todas as coisas.

Num simples e singelo piscar de olhos, tudo pode mudar. As ondas num vaivém constante. As formas variadas de covardia. Aquela velha mania de sentir-se imaturo para tudo, até para um simples e-mail. Às vezes, as dores vêm de lugares que desconhecemos, são atingidas pelas mais simples coisas da vida e podemos até ver além de um simples sentimento. Mas ainda têm aqueles que não sabem o que fazer com o coração. Não sabem reagir diante de tamanha necessidade. Outras vezes, a vida faz um curso diferente daquilo que esperávamos. É tal velocidade do giro. Tudo, rápido demais.

E hoje é o último dia do ano. O dia em que fazemos promessas, guardamos cartas, fazemos melhorias físicas e espirituais. Amanhã, o mar leva tudo embora. Os barquinhos, as velas, as cartas, oferendas, sentimentos e longos vazios daqueles que nada desejaram. Aqui, desejo isso mesmo! Cada dia um pouco mais de verossimilhança e sem passar desapercebido. No próximo ano, espero ainda muito daquilo que ofereço. Mas as certezas são maiores que as velas ou as chamas e fogos de artifício.

Amanhã, um outro dia. Comum. Ordinário.

Com uma pitada de mudança.

Monday, December 22, 2008

Madonna

Uns não se interessam. Outros, a lei do menor esforço prevalece sempre. A indiferença de alguns pode, por vezes, machucar. As questões são irrelevantes. Se preferem a angústia ou mesmo a amargura de ver o oposto de tudo, pouco importa. Nada se equivale ao saboroso caminho de se sentir livre. Começar o ano, talvez, com um pouco mais de força. Mas são vários os porquês de dois dias em que tudo ficou em câmera lenta.
Riscar da lista do que fazer antes de morrer, eu risquei. Marcar o quanto meus amigos são importantes é só um reforço. Pular no refrão bordeline, segurar minha mão ouvindo ray of light ou simplesmente me dar espaço para o espanto da realização de um sonho. Tudo somado a, sim, realizar mais do que um sonho, mas deixar marcado nos lados mais reluzentes da memória um espetáculo, um sentimento mútuo, luzes, câmeras, som, batidas e o cabelo loiro. O rosto, bem perto, e a simpatia estelar. Nada se soma aqui. Às indiferenças, ou mesmo o desdém ficam marginais, sempre. Para quem preferiu a amargura ou a angústia de economizar na felicidade. E saíram todos gritando. Give it to me, dançando like a prayer ou mesmo no despeito ensaiando um shes not me em casa. Da chuva ao céu se abrindo rapidamente. Por trás, um filete de sol bem humorado e quente. Tudo se transformou. Dois dias em que o clima foi traído, os relógios ficaram sem ponteiros e os pés, os pés deixaram-se vencer e agitaram o corpo todo.
Aos que não se interessaram, restam as notícias online. Aos que preferiram a lei do menor esforço, cabe agora a boa inveja. A indiferença...bom, a indiferença é só mimo. No fundo, todo mundo se importa.
Já eu, termino o ano com a sensação mais plena que eu poderia ter. E não canso de repetir

and i feel, like i just got home.

Wednesday, December 17, 2008

Público

Ninguém mencionou mais o mesmo assunto. No final do ano, sempre as mesma posturas. Rememorar o passado e trazer ao presente diferentes maneiras de se apresentar ao novo ano. Oferendas, restos de velas, cadernos, incensos, fogueiras, anéis, fotografias, lembretes e cartões. As rosas estranhas e aqueles vasos antigos. O mesmo livro de cabeceira. Perdas, ganhos, fatos e eventos que mudaram, foram mudando até o ponto cedo dos olhos. Ninguém muda por acaso. As retrospectivas que nos lembram cada fato. Entregar rosas, prender o cabelo ou mesmo um novo corte. Em dois ou três anos em que tudo passou num piscar de olhos. As novas maneiras de se entender o mundo, de dançar ou até mesmo de ouvir uma música.
O ano que começa com aquela sensação de começar novamente. Não começa. Não termina. Os calendários mudam as datas, os dias e assim vamos reprogramando o cotidiano ordinário em cada vírgula. Perder namorado, mãe, carro, dinheiro, emprego, livros, discos e ganhar tudo de novo, namorado, apartamento, dinheiro, emprego, livros e discos. Ganhar uma porção de noites mal dormidas, bem vividas, noites de insônia, doenças, cáries nos dentes, gripes, unhas roídas, tênis rasgados e perder tudo de novo. Seja aos poucos ou de uma vez só. Ganhar presentes, sorrisos, perder um dente, uma vontade, viajar, deixar para trás, trepar, beijar, suar e dormir. Dentro da jaula, ninguém vê o tempo passar. Ontem e hoje. Resumindo os meses, os anos e um pedacinho da vida.
Ir atrás, sempre atrás de um novo começo. Aquele assunto, de certo, ficou para trás. Seja calendário ou uma data apenas; fogos de artifício ou oferendas, eu mesmo, nunca mais toquei naquele assunto.

Wednesday, December 10, 2008

O Coelho da Cartola.

Ninguém poderia advinhar. Nem sempre, o que se vê na luz é reflexo ou sombra de si mesmo. Se por instantes tudo parecer estranhamente sem forma, cor ou rima, é porque do Vazio nada se pode enxergar. Aquelas pequenas monstruosidades, ou com o mesmo virtuosismo de sempre, ninguém pode negar a dor de um tapa na cara. As vertigens adolescentes, os galopes pesados e o corpo frágil pedindo arrego. Os braços cansados de tamanha batalha, bolhas no pé e o pulmão já sem saber o que fazer. Desse estado, dessa litúrgia, nada sobrou. Apenas a vontade de um dia melhor, ou que se possa acordar com o cérebro descansado.
Dias corridos, noites de sono pesado. O corpo doente. O corpo pedindo atenção à saúde. Ninguém poderia advinhar que tamanha monstruosidade teria efeitos colaterais tão profundos. Da enganação, do desespero, do sexo e de tudo mal construído nas bases das falsas intenções.

Tuesday, December 09, 2008

Schopenhauer.

As atualizações de um sentido outro. Seria sentimento, pura explosão do corpo em pequenos astros reluzentes. A decadência das luzes, do material e do espiritual. Aquilo que enxergamos, já morto há milhares de anos. Nem estrelas, lua, ou mesmo anéis e bambolês. Não adianta olhar para cima. Gigantes, enormes pegadas e aquele peso quase desumano. O mundo nas costas.
Esse mesmo sentido outro, as coisas fora do lugar e sendo postas num canto, o canto direito do olho esquerdo, tapando e impedindo que a lágrima se deixe livre para escorrer sobre a face. Seria mesmo uma espécie de raiva. O mundo, a representação daquilo que se é enquanto matéria mal-formada. Da moral e até mesmo da Ética, pouco se pôde aprender. Das razões do espírito, leve ou fugaz, carregar a cruz seria melhor do que as mil chicotadas. Ele, sentido de toda construção, Ele mesmo a quem adcionamos letra maiúscula, nada pode fazer. As vontades e os sentidos. É o final do ano, as famílias reunidas, a vontade de querer reparar os vasos estilhaçados. Nem mesmos nos transfiguramos e já estamos pensando em pequenas oferendas aos deusas da antiguidade. Aqui, só a explosão de uma nova era. A era dos falcões, das águias voadoras que percorrem velozmente todos os estados da alma, pousando por fim naquela única ferida que não cicatrizou. As crianças abusando da boa vontade, experimentando brincadeiras e perversões. Restou somente a idéia do antigo menifesto dos laços eternos: rompê-los, todos, em um único e brutal movimento.
As atualizações do sentido. De pedra em pedra, pó em pó, choro em choro, resta a aversão do mundo. A representação do espelho. Cassandra sussurrando ao ouvido: largue-te! teu vôo alcançou outros ares.
Abdicar ao mundo.

Monday, December 08, 2008

Pequenos.

Foi preciso muito tempo. Os agudos conselhos e a intermitente vontade de mover-se, daqui, dali e de todos os lugares. É preciso mais do que isso. Do espírito, da fé e de todo o resto que nos foi ensinado desde o berço. Ainda é preciso entender a maldade, a perversão das crianças assustadas que, levianas, passam a destruir com os dentes qualquer presa que se torne fácil. O calor movendo-se contra as nuvens-de-sombra. Ontem e hoje fervendo pelo insistente vapor dos banhos e curativos. Cicatrizar é um processo deveras doloroso. Mais doloroso, é a busca por aquilo que não somos; pelo inexistente, ou pelo vazio do Nada. Como diria Nietzsche, “À medida que buscamos as origens, vamos nos tornando caranguejos. O historiador olha para trás; até que finalmente também acredita para trás.”
É preciso tempo. Acalento. Infusões. Sentimentos amargos. Dor, agústia e alegria. Deixar o peixe apodrecer. Renegar à existência de qualquer espécie de fé ou ligação com o mundo material-espiritual. Abdicar à Ele, a Deus, abdicar à carne, ao corpo, ao espírito como forma de condução dos pés na brasa. É preciso tanto esforço. Ler demais, devorar cada palavra e cada vírgula de um texto, sem pé nem cabeça. Para entender o mundo, basta a fome pelo confinamento de grades. Entender esse raciocínio fraco, insosso e perverso.
Foi preciso muito tempo. Descobrir o mundo tal como ele é, em essência e representação. Do todo, a menor partícula. Da lágrima ao mais puro sorriso. Ainda é preciso mais tempo. Descobrir do mundo, os abusos, a solidão dos astros e Estrelas. Entender as crianças perversas, saborosas criaturas do desespero humanístico. Isso soa um tanto desafiador.
Por isso. É preciso mais tempo.

Monday, December 01, 2008

Charles Dickens

Quando adolescente, tive contato com grandes clássicos da literatura. Por influência do meu padrasto, inicie-me na leitura de grandes nomes como Alencar, Machado e Monteiro Lobato. Posteriormente, da amizade com a uma senhora linda e simpática, dona de um sebo de livros no Itaim, meu espólio de leitura aumentou. Passei a ler, por indicação, Nobokov, Jane Austen, Laclos, Eça de Queiroz (que segundo ela sabia descrever o sabor das tradicionais comidas portuguesas como nenhum outro autor). Desses encontros, ganhei em um natal um livro volumoso, antigo e com cheiro de passadas de mão chamado Grandes Esperanças. O autor, Charles Dickens, um dos maiores nomes da literatura inglesa e atormentado pelas memórias da infância triste, pobre e mal-resolvida, causou-me um impacto maior do que eu poderia supor anos mais tarde. Dickens certa vez disse "it was the best of times and the worst of times (...)". Referindo-se a incapacidade dos homens em conciliar o Bem e o Mal no cotidiano. Anos e anos mais tarde, Freud completou em uma entrevista, ao ser questionado sobre o que seria uma pessoa normal, dizendo que uma pessoa normal é aquela que consegue conciliar o amor e o trabalho. Esse equilíbrio do viver responsável (racional) e do viver lúdico (passional). Essa pessoa que entende que o equilíbrio da vida deve pesar as neuroses da ética e da moral com os impulsos sexuais. Daí, nasce a incapacidade do homem contemporâneo em atingir um certo estado de felicidade, não plena, e tão pouco momentânea. Dickens, estava certo. Hoje, são os dias somados, subtraídos e multiplicados por milhões de afazeres chatos à alma, essenciais ao viver e ainda assim, cansativos.

Esses dias ensolarados que ao entardecer trovejam, relampeiam, jorram fortes lascas de chuva grossa e gelada. Nada tão incomum quanto isso. Ainda, temos as variedades do cotidiano: arrumar um namorado, estudar, trabalhar e todos os outros pormenores dos dias que somados, formam um grande círculo de mediocridade, sentimentalismo e castração. E isso não pode ser somente uma fixação da infância, como no caso das fases freudianas mal resolvidas. Roer a unha pode ser um sintoma de nervosismo, puro e simplesmente. E tudo isso se somando ao final de semana, ainda pode dar um resultado, talvez, delicioso. O descanso, os atos típicos do cansaço. Dessa delícia, nos fazemos. Os anos passam, as horas cada vez mais apertadas, os cabelos envelhecendo, a pele do rosto se contraíndo, as mãos com calos incuráveis. Uns chamam de envelhecer. Outros, recusam as linhas de um tempo que jamais voltará, mas que deixou as marcas para os espelhos, lembrando sempre o quanto se passou, de bom, de ruim, dos tempos de infância e banhos de mangueira no verão. São as linhas da saudade e concomitante ao Eterno Retorno - essa aproximação, cada vez mais veloz ao ancestral, ao espírito e ao pó.

Hoje, sinto saudade. Houve um tempo em que minha única preocupação era nunca ter lido Goethe. Mal sabia, lá atrás, que um dia, isso seria saudade e não conhecimento.

Friday, November 28, 2008

Bem-vindo.

As palavras vão costumeiramente circulando todos os fatos. Do passado ao presente, falo demasiadamente sobre os eventos que me alfinetaram nesses dois anos. As causas perdidas, a fome de morte e uma certa vontade de explorar o mundo como representação do meu próprio espírito. E os leitores, por vezes tão vagos, me visitam intimamente na procura de um saber ou de um entender de vozes, cantos, mitos e poesias que construam um pouco e desconstrua muito do que eu sou. Não há mistério algum. Se a palavra comum não fosse curta, ou pouco expressiva, poderia, eu mesmo, usá-la ao meu favor. Nem procuro mais entender o porquê de tudo. O melhor é sentar. Hoje me deu vontade de ler Barthes. Há tempos não abro nenhum dos seus livros empoeirados na minha estante. E tudo isso, as palavras que escapam da minha boca, voam pelo profundo e desértico mundo das coisas mortas. Falar do passado é dar sentido ao presente. As paixões cada vez mais distantes e cindidas, vou em busca de muita mudança, cores para pintar parede, decoração expressiva e um lindo sofá. Queria mesmo objetos de famosos e renomados artistas do design moderno. E imagino se pinto as janelas de verde-escuro com as bordas brancas ou tudo branco mesmo.
Sempre esperei o dia em que o mundo fosse girar, sem que eu percebesse, pois as surpresas me agradam. Minha fome em dizer ainda ficou presa na garganta, como um nó que me fizeram à la marinheiro. Eu poderia nesse exato momento correr até a porta do seu trabalho dizendo certezas do futuro para dois. Preparar buquês românticos de rosas vermelhas. Acontece que o romantismo ainda está com lugar ocupado. Levarei cravos. Ainda assim, estou à procura de um vaso grande para o corredor. Luminárias para a cozinha e um monte de outras coisas pequeninas que farão minha vida um pouco mais colorida. Digamos que tem espaço, só é necessário um passageiro. Amanhã, quero flores na minha porta e um lindo cartão:

"Sem bem-vindo!"

Saturday, November 22, 2008

Os nove passos do sucesso

Eu não espero. Não tem mais aquele valor fatídico e virtuoso de conseguir caminhar lentamente. Eu não espero. O seu telefone, súbito, melancólico e cheio de segundas intenções. E trocamos tudo pelas mensagens de sms do celular. Eu não espero. E quando naquela tela pequena nos encontramos, eu pareço ainda pular, como uma criança. Eu não espero, mas meu coração saltita, dá pulos e volta para a realidade sofrida na qual criamos um espaço único e raro, repleto de linha pintadas de amarelo que não podemos cruzar jamais. Essa saudade surda que nos faz largar o mundo e correr para a linha do telefone e para as nossas vozes já silenciadas por tantas mudanças. Eu não espero. Sento e ouço repetidas vezes o mesmo alô e o mesmo beijo, tchau. E ainda depois de tanto tempo revivido, ainda pensamos que ao final um dos dois dirá eu te amo e o outro responderá ansioso e morto de vontade, eu também. No começo de cada dia, vem aquele pensamento inquientate e pungente de hoje será o dia. E esse dia nunca vem. Eu não espero. Flores na campanhia, cartas seladas com perfume Yves Saint Laurent. A medida que tudo passa, as nuvens se aglomeram e o calor cessa, fica aquela interrogação.
Eu não espero. Pelo o quê ou por onde, eu sento e descanso os ombros em cima do corpo. Quem sabe o que esperam os dois, cada um de um lado da linha. Eu não espero você, mas os sonhos me traem e você quieto, desliga o telefone.
Eu não espero, mas eu sempre ouço a sua voz e você a minha.

Tuesday, November 18, 2008

Olha pra cima.

Tudo aquilo que flutua. Sobre a cidade já repleta de luzes coloridas, enfeites cintilantes e árvores com as pontas brancas, imitando a neve que nunca caiu. O Céu coberto de nuvens cinzas e os dias caminhando entre gotas de chuva e ventos aleatórios. O cenário de um dias e dias flutuando paisagens, idéias e uma certa leveza preocupante. Nada mudou desde o verão passado. Até mesmos os enfeites de natal são os mesmos. Ninguém espera mais beijos antecipados ou romances novelísticos. Por vezes, mil vezes, esperei um acontecimento gigante, com novos intrutores de renas animadas e gorros vermelhos. E tudo aquilo que era sólido, hoje flutua no imenso paraíso das causas perdidas.Ali, naquele pequeno espaço, príncipes, rainhas, desertos e vastos oceanos confundem-se com a idéia de que o inconsciente foi desenhado para nunca parecer mais do que ele é.
Infinitos. Distantes. Incapazes. Tudo tão efêmero. Os laços cada vez mais tênues e soltos. O nó desamarrado. O tênis gasto. São apenas cenas da vida. Do cotidiano maravilhado com a possibilidade dos sonhos em carregar para longe, todas as vidas de um único dia. Se construir em torno do que somos. Nada mais atormentado do que essa idéia. São como pesados elefantes prestes a invadir a sala e derrubar o único copo de cristal que sobrou em cima do móvel gasto.
Tudo aquilo que flutua, feito a neve que não existe aqui. A neve que não vai cair. Mas esperamos, olhando para cima. Já é quase natal.

Num adianta olhar pra cima.

Friday, November 14, 2008

Algo no ar.

As razões, dentro de pequenas bolhas. Sabão. Uma fina camada translúcida. Meio colorida. Uma bolha de sabão. As verdades e as mentiras. Coloridas. Frágeis para o vento. Leves como o próprio ar. Do canudo, ao vazio. As razões e os atos. Voando alto. Já perdendo força. As ligas do sabão rompendo-se. Logo, uma fenda aberta. Vontades e realidades. Desce. Pequena. Sem força. Só a bolha. Aquilo que se deseja. A transparência da água. Incolor. Sentimentos e paixões. Estoura. Do ar, caem os respingos. Gotículas espalhadas pelo chão. Foi uma bolha. Colorida. Sem sentimento. Paixão. Espalhada na calçada. Foi um dia. Pelo canudinho. Um sentimento. Tesão. No ar, o resto de um dia. Os rasgos da vida cotidiana.

A bolha e o sabão.

Wednesday, November 12, 2008

Walking down the street

Adoramos um sonho impossível. Adoramos aquela sensação de que possa existir algo que desconhecemos, esperando na esquina. Todas as idéias deliciosamente perversas. É disso que somos feitos. Até a mais cínica das mulheres sonha encontrar um homem que a faça feliz e até o mais desencatado homem anseia pela mulher que o transformará. Estamos numa busca constante pelo impossível. Ela sempre nos dá a sensação de que, mesmo sem, estamos à espera daquilo que nos preencherá. Lendas urbanas. Aqueles sonhos repletos de travesseiros, músicas românticas, noites e mais noites de conversas em bares e amigas e amigos consoladores. Se chove, é motivo para projetar possíveis situações de encontros, unidos pelo inesperado. Ninguém procura um esforço, mesmo que pequeno para acordar do sonho, ir em busca daquilo que se quer e pronto: ser feliz. Adoramos um sonho impossível. É claro, eles são deliciosos e preenchem milhões de momentos carentes e solitários. Dão sentido às noites de sexta-feira ou um sábado em que tudo o que se espera é um telefonema e até os domingos familiares. Esses sonhos tão cheios de irrealidades, mas borbulhantes de romances cinematográficos. Esperamos sempre um sonho na esquina, no cinema, no bar, na rua, no ônibus ou esperando na fila para pagar um livro. Adoramos um sonho impossível.
E não há como escapar da inevitável questão: por que esses sonhos impossíveis estão sempre, em sua maioria, ligados ao amor?
Talvez, seja porque o amor, o tão idealizado amor, o mais lindo, puro e honesto sentimento seja a única forma que encontramos de alcançar um possível e idílico paraíso. O amor será o salvador. Eu emagreço quando ele aparecer. Se eu encontrar uma menina assim, desse jeito, eu caso. Eu quero um menino de cabelo bagunçado, meio avoado que seja parecido comigo. Seja como for, estamos em busca desse preenchimento do vazio que nos foi dado no nascimento. Essa sensação que carregamos de profunda solidão do quem sou eu e para onde vou, certamente, seria suprida se encontrassêmos alguém com quem compartilhar, dividir e, por fim, encerrar a pífia sensação.
Posso estar enganado. Pode ser simplesmente porque queremos nos sentir desejados. Pura e simplesmente. Verdade não há.
Ainda, pode ser bem mais simplificado: queremos isso, tudo isso, os amores impossíveis, o homem rico que se apaixona pela garota de programa, ou seja como for, pelo simples fato de que aquele amor idealizado seja a sensação mais gostosa que podemos, um dia, experimentar. É como estar, 24h por dia, num pleno orgasmo. Simples: é muito, muito gostoso amar e ser amado. E quanto mais difícil, melhor e mais valioso será, afinal somos seres dito humanos.
Ou, pode não ser nada disso, mas é por isso que eu adoro poder sonhar, seja com isso ou com qualquer outra coisa.
Mais ainda: é por isso que eu adoro Pretty Woman.

Tuesday, November 04, 2008

Antigos

Não existiu nem a poeira, nem mesmo o som veloz da partida. As vozes se intercalando no escuro, recitando pequenas frases amorosas e o silêncio completo. Era o começo de tudo. Uma espécie de sagração. Início do efeito. Ali, tudo se desmancha rapidamente. Laços açucarados e uma vontade maior dizendo que no rastro, nem mesmo a poeira ficou para dar sentido ao discurso matemático.
Leves caminhadas. Leves toques no rosto. As noites cansadas de velas e dores oculares. Nem rastro nem poeira. A subida leve e inquietanta da fumaça. Da sala, um cheiro estranho misturando-se aos ramos de eucalipto presos no prego da parede. Os quadros tortos, todos réplicas de pintores renascentistas, já não mais serviam como um adorno à decoração; estavam lá prestando homenagem aos antigos que passaram pelos corredores e que ali apontaram o dedo. O quarto desarrumado e o banheiro com goteiras no teto.
A mesa da sala, talhada em madeira maciça, estava coberta por uma leve textura branca de poeira. Era um vazio. Todos os momentos em que o estado de espírito havia sido maior que o próprio caminho. Morar, era senão uma condição do momento.
Nos vasos, as flores artificiais também estavam com cara de mortas. As antigas toalhas e os vidros embaçados. Apenas a sensação de que um dia, tudo foi habitado. Seres e histórias. E como um sopro forte e quente, foram-se todos. Retratos, manias, surtos e doenças, deixando para trás o rastro.

Uma pequena nuvem de poeira.

Monday, November 03, 2008

01.11.81.

Eu acordei com vontade de escrever um texto de agradecimento. Queria agradecer tanta coisa. O comum da vida, o corriqueiro e não menos, ordinário. Eu queria agradecer os tapas que levei quando criança e agradecer àlguém por fazer chover no domingo. E nem sempre é preciso dizer tanto. As palavras mastigadas e uma certa maestreza para fazer do óbvio o incomum.
Eu queria agradecer por entre caminhos, espinhos, razões e desde de que me disseram num jogo de tarô que nada na minha vida acontece por acaso, eu queria agradecer aqueles que estiveram comigo.
Aqueles que estão ali. Sempre. E que fizeram do meu sábado, um dos melhores da minha vida. Simples assim. Sentimental. Piegas. De lágrimas e risos. Encontros, re-encontros e desencontros.
Eu só queria agradecer.
Eu não poderia ter uma família melhor.

Thursday, October 30, 2008

13:24

Sempre aquele sonho batendo e esperando na janela. Nem adianta mais fingir que cortou o cabelo e que agora possui faculdades que permitem dizer isso ou aquilo. Aqueles estudos sobre psicologia e manifestações do inconsciente de nada serviram para que essa tal fraqueza fosse suprida. Eu, que espero verões por todas as horas do meu dia, aguento o som pesado dos meus próprios passos. Fui aconselhado e me desaconselhei. Ontem, escolhi outros momentos de felicidade mórbida; aquelas de pensar em você. Sacrifico-me feito um animal para dar sempre um sorriso quando te vejo no canto dos meus olhos. Mas isso tudo é vontade de dizer que nada mudou e ao mesmo tempo, tudo está diferente.


Eu digo: dos sonhos levamos apenas a sensação. Você ainda na sala dizendo que minha comida está sem sal.

Sunday, October 26, 2008

26.10.

Eu posso, dar voltas, caminhar entre paredes imóveis de concreto ou cerâmica branca, deixar crescer e cortar o cabelo. E eu sempre tenho uma novidade para contar. Seja com os dedos, ou simplesmente pela minha voz rouca de fumo. Costumo ter essas preocupações com o futuro e a descrença do mundo. Observo as pinturas mais secas, talvez Pollock ou Bacon, tão cheias de emoções, contundentes e aos poucos vou indo na direção contrária. Eu espero anos se passarem como paisagens de um auto retrato. Eu canto e danço, sapateio o destino forte, porém tosco, com batidas pesadas. E há tanto para se entender do espaço, das estrelas e de astros enterrados que por vezes pareço me perder com um simples piscar de olhos. Rente, o corte das laterais rente ao couro, procuro detestar filmes românticos ou músicas festivas. Nos dias de hoje, nada mais é arte. Tudo tornou-se pretensão para um possível futuro de espelhos. Eu ainda querendo traduzir a frieza daquele olhar. Agosto, tornou-se um mês insípido e insignificante. Nas ruas, lenços palestinos, galochas, casacos de cotelê roxo e eu caminhando apenas para ter um sentido de pernas. Pessoas estranhas, um pouco familiares entre tanta vontade de se reconhecer como mais um estranho com um passado pesado. Misturo-me ao desconhecido e viro mais um. Ali, naquele lugar, é a única possibilidade. Estar entre o forte som das buzinas e os letreiros luminosos. Onde há tanta fumaça, seja dos charutos de executivos ou mesmo das banquinhas de hot dog. Meu show começa cedo, logo pela manhã. A retrospectiva incerta, pouco racional, de eventos, livros e poesias que fizeram um grande novelo, acabando como uma colcha retalhada com panos velhos e desgastados. Já é quase natal e o único presente que comprei foi um óculos de imitação estilo Bob Dylan. Contar as novidades, o crescimento dos pêlos no peito e nem mesmo a nova reforma na gramática permite que as cartas sejam diferentes das de ontem. Eu digo que as novidades tornaram-se grandes temas para conversas em cafés ou nos bares da Rua Augusta. Se saber viver é isso, talvez um gran finalle seja apenas uma má idéia entre tantas outros, como aquela idéia de se vender talentos. E no que posso dizer, um novo apartamento com banheira clássica de cerÂmica branca, mas a única coisa que levo são alguns acordes de um noturno de Chopin que aprendi a tocar com um mão. Os livros da Virginia, Faulkner e Cortazer numa prateleira que gosto de chamar de especial. Toda a coleção de Pessoa e literatura italiana moderna. Assim, se foram os anos. De ouro, prata, assim foram os anos. Tudo passando rápido ou o mundo parece ter empurrado tudo. Ainda os retratos de amizades desfeitas e uma péssima idéia de reatar laços corroídos pelo desgosto. Seja isso, ou aquilo, agosto tornou-se um mês transparente. Eu nem mesmo contei as datas esse ano. Ano da morte, ano do amor desfeito e dos pássaros que migraram para o norte. Um falo império de sentidos extremos. Letra e cor.

Eu posso, simplesmente, dar uma volta. Mas acabo sempre no mesmo lugar. Aqui, e ai.

Thursday, October 23, 2008

Love is a losing game

Eu vou escrever de um modo simples.

Eu vou detalhar os fatos de uma impossível causa de conquista.

Poucos instantes.

Aqueles intermináveis segundos antes de colocar o telefone no gancho. Ali, parado diante de tudo o que se passou. Ali, como se estivéssemos diante um do outro. Era aquele sabor do sonho, o sabor da vida, do amor conhecido como amor, do sexo, do desejo, dos cabelos e de cada fio do braço. Eu ali, diante do telefone, esperando, depois de dois anos e dois meses, que algo pudesse ter mudado. E quem diria que depois desse tempo todo um orgulho apareceria. Rei, comandando cada passo da minha forma passional de entender e viver. Ali, antes mesmo que eu colocasse o telefone no gancho. A presa, fácil. Mas eu ainda poderia escrever mil cores, descrever a delícia que fomos um dia. E do futuro eu certamente utilizaria meu talento para dar pinceladas em tons fortes, mas ali, só o branco, misturando todas as cores. O branco da cegueira, o branco de mil coisas, o branco da minha roupa por debaixo da pele. Depois de contruir muros e muros, derrubar, ajustar, erguer, cair, reerguer. Agora, depois desse tempo injusto, depois do morto na cova, nada, nada mesmo pode me fazer esquecer quem eu me tornei. Ninguém, nem mesmo eu, poderá um dia dizer que não foi à duras penas que deixei de carregar no canto dos olhos, uma pequenina lágrima.


E ontem, pela primeira vez em muito tempo, deitei e chorei.

Saturday, October 18, 2008

Um dia a mais

Aos sábados, espera-se aquela estranha sensação de outrora. Alguns fatos acumulados no bolso. Estranho mesmo é sair quando a chuva manda que tudo fique parado no espaço de 48 horas. A leitura de livros de filosofia, os olhos ziguezagueando pelo quarto escuro. Lá fora, as nuvens aglomeradas em diferentes escalas de cinza e roxo. E como se estivéssemos escorrendo, gotas de folhas e as árvores reverenciando um dia a mais em nossa existência andarilha.
Caminhar com passos vagarosos estalando pequenos surtos de ansiedade. Assim, se pode ver os faróis ficando verde. Nas faixas brancas, todo mundo atravessando e segurando a aba do casaco. Ninguém mais usa chapéu. O trabalho com carinho excessivo e a destruição daqueles olhares tão íntimos. Aos sábados, o gosto daquilo que não foi feito na semana. Contas atrasadas, televisores desligados e livros empilhados. Mais uma noite de sono perdida. O retrato familiar em cima da mesa querendo despertar sentimentos enterrados nas salas de terapia intensiva. O gosto amargo e esfumaçado do cigarro, na língua e na garganta. Nem mesmo se pode notar que havia ali na avenida um novo conjunto comercial; os dedos roídos. Ninguém procura mais tatu-bola ou lesmas nos jardins criados como canteiros de avenidas. No ponto de ônibus, se aglomeram diferentes guarda-chuvas. Capas transpartente e amarelas para cobrir o corpo e fugir das poças.
Aos sábados, o gosto antigo de esquecer que o mundo existe dentro do mundo. Ser apenas uma fração daquilo que um dia se esperou ser. Talvez, criar uma poesia sobre hábitos do cotidiano. Nem isso mesmo. Às vezes, o sono é o melhor dos remédios.


Aos sábados, uma fina chuva, um gosto pelo presente e as sensações do futuro despertando em cores, sentidos. O caos do final de uma semana. Ninguém se espera aos sábados.

Wednesday, October 15, 2008

É.

De tempos em tempos, conseguimos sentir a terra girar. Sentir o movimento e quase um balanço de tudo. Se olharmos atentamente para o céu, esse movimento passa, talvez, nas nuvens. É só uma dúvida. Mas é nesse movimento de giro, nesse vaivém das coisas que, vez ou outra, caímos no mesmo lugar. Os céticos, passam a acreditar no mistério. Sem mistério, ele não existe. Os passionais se deparam com a dura realidade do racionalismo puro e essencial. Eu, eu me deparo com aquilo que me recuso a aceitar. É uma questão de crença. Tudo girou, parou, voltou a girar, e ontem, sem que nada pudesse ter efeito, eu voltei para o mesmo lugar. Ali, na minha frente veio alto, doce, engraçado, me dizer que é exatamente esse o tipo que eu preciso na minha vida. Nada mais de arrogâncias sexuais, pendantismos artísticos, máscaras de infância perdida, sentimentalismos baratos da vaidade e até mesmo antigos rumores de que o amor é ligar toda noite para alguém. Esse giro. Esse giro que faz com que haja movimento entre o que se viveu, com o presente de se estar no meio.
Não que ele pudesse ser meu. Ele não pode. Ao menos, ele tornou-se esse giro que me mostrou que ainda tem um "Q" de espera por vir. Mas nada mais dessa pintura torta, dessas músicas regradas ao doce sabor do fútil e até mesmo as vontades do ego espedaçado. Aqui, só a suavidade de acreditar, de me fazer sentir que de giro em giro, pé em pé, a gente sai do lugar.

Monday, October 13, 2008

Pela décima vez

Alguns fatos repetitivos. Na matemática o número de chances é quase um teorema de resolução impossível. Se fosse nessa mesma idéia, talvez fossem os tais números primos. Mas nem sempre se pode resolver equações. Os resultados não falam por si. Nem ao menos se sabe o que deu errado. Se foi a soma ou a subtração de idéias, equações mal formuladas, raiz quadrada de problemas insolúveis. Nada, nada pode definir melhor esse estado de mãos atadas como o resultado nulo. Talvez usar o infinito seja uma forma de se contentar com todos os pormenores do presente. Sim.
Um pedaço de carne rasgada. Uma vela acessa e tudo empilhado na estante. O conhecimento de anos e os longos percalços. Ali, parado na estrada deserta de pouca luz, o sonho que nunca foi resolvido. As pretenciosas escapadas pela culatra. Onde e hoje, as indas e vindas. Tudo se repetindo, como se a própria matemática estivesse numa espécie de curto-circuito.
Fatos repetitivos. Semanas e meses inteiros. As mesmice de sempre.

Sunday, October 12, 2008

Desejo e Reparação

É uma verdadeira desordem. As fontes de inspiração entre padrões de escrita e relativismos. E tudo parece feito de metal. Aqueles tamanhos fenomenais. Sim, grandes padrões. Depois de horas de um sono profundo, pesado e desorganizado. Nem mesmo é possível colocar em as palavras na ordem certa. Elas se perdem, voltam e pedem uma outra ordem. Se eu colocasse em lista os sonhos que tive. Talvez todos os desejos. O desejo de responder um e-mail grosseiro, apagar as ligações telefônicas de uma sexta-feira. Nem mesmo o passado conseguiu um lugar no caos. Ele ficou onde deveria ficar. Enquanto isso, algumas forças que me cabiam prestaram mais do que uma simples atenção. Arvores negras e chuva incessante. Esse texto é só para constar. Tem horas que a mente não aguenta e tudo passa pelo canal do relativo. Isso ou aquilo.

Friday, October 03, 2008

On the road

Nas incessantes buscas por um estado permanente de felicidade absoluta, as armas e os barões assinalados se foram.


Praias, desertos, pequenos pedaços de gleba, mudas de eucalipto e o terro arado. Naus furiosas, um antigo passado, daqueles remotos tempos de sermões escritos na areia da praia, dessa herança que vem tardia encontrar os destroços daquilo que um dia foi o sonho do paraíso. De toda nudez verdadeira, o castigo foi a castração definitiva. E tudo, todas as idéias inovadores, pelo assassinato do subjetivismo ou mesmo do relativismo moral a que estamos tão acostumados, nada restou.


Incêndios, ventos com a força de um mito, norte, sul, sem bússola ou tecnologia para se saber chegar. Uma incenssante busca pelo eterno, por aquilo que dá o sentimento de duradouro, fora de nós, no outro e naqueles que nos são semelhantes. E dessa busca, todos os resultados esquizofrênios e pelo menos uma vez na vida, tudo parece em completa desordem. Soltar pombas-brancas, libertar animais em extinsão, deixar tigres, leões, onças e até mesmo aquela ave-azul-raríssima, deixar tudo solto. Tudo é uma questão de entender essa nossa herança que nos veio corrompida pelos desejos dos nossos ancestrais. Aqueles que trouxeram nos baús pilhas de roupas sujas, algumas doenças venéreas, dentes podres, um ou dois livros e toda a esperança de um dia ser o sonho. E desse sonho, fizeram sua viagem.
Exatamente como fazemos hoje:


do sonho, esperamos ser aquilo que não somos. conduzidos mar afora, sabe lá deus por quem.
Mas conduzidos por um sonho, talvez, inexistente.

Monday, September 29, 2008

As horas:

para tudo, um segundo apenas. As paixões do passado e os pequenos resquícios de uma vida passada. Nem por um minuto, para e pensar no que a reconciliação poderia ser. Pensar sim nos amores passados e naquela felicidade de momentos que por vezes pareciam duradouros. Pensar em como nos transformamos em afastamentos cada vez maiores, largando pelo caminho pedaços daquilo que fomos. Nessa possibilidade, aquilo que somos, que sou e o se desfigurou dali em diante. As marcas apaixonadas, as fomes de olhar e toda aquela parafernalha sentimental que nem ao menos esquecemos de colocar um ponto final. ´

Nada pode marcar mais do que o simples dizer "eu te amo". Correto, Freud nos deu a dica. Os impulsos de desejo. Sim, somos movidos por esse desejo, desejo de coisa, do saber, do sexo e da completude. Essa marca quase ardente, presa à pele, à memória ao sangue do viver, essa marca "eu te amo" não é um simples formar de convívio. Isso que nos torna, talvez, maiores por alguns instantes, também pode ser a cova do espírito, já que é nessa expressão, a mais próxima que encontramos para um estado de magia, que tudo se prende. É como se, ouvindo, estivéssemos enfim descoberto a chave do mundo. Sentir-se amado fora do berço. 

E a presa, como animal mesmo, jamais escapa do predador. A presa da rede do "quero mais". Estamos sempre na busca desse cálice nada sagrado. A busca por um "eu te amo'. Talvez seja a busca eterna pelo estado de magia. Sim, pode ser ainda mais por suprir a solidão, a imensa solidão que se instaurou no espírito do homem moderno. Cindidos, fragmentados e desconfigurados, nós, os homens modernos, na busca pelo felicidade e pelo estado pleno de magia, não cansamos de querer mais e mais, daquilo que nos foi o mais próximo da completude. Ali, naqueles instantes, naquelas horas, não estávamos mais sozinhos. O mundo enfim, havia sido descoberto e ali era o momento, talvez, a felicidade. Porque isso também é busca eterna. A busca por entender. E como foi bom, naaquelas horas, ser amado. Por algumas horas, todas somadas, tudo isso que forjou a magia, tudo o que se arquitetou naqueles exatos momentos. Horas e mais horas empilhadas no coração, formando carências, pequeninas alegrias. Sim, a fraqueza em sua real materialidade. Bastar apenas no outro. E nessas horas, se tirarmos um minuto da pilha, tudo desmorona? Por onde andou tamanha desordem? Ordem no caos? Por um segundo apenas, reescrever, pintar, traçar pequenos padrões para o mundo. Ah, mas que alegria poderia ser tudo isso. A constante emoção dos covardes e agora se pode aposentar o espelho, já que o outro se cumpre no papel. 

Por um segundo, somar tudo, os minutos e todo o resto nessas horas de vida, em que ser amado, bastou. Lá fora, algumas horas. 

Monday, September 22, 2008

Algo A +

Não é a mesma sensação. Tributo ao desaparecimento, vagaroso, de um outro que não serei eu. Das sensações futuras, aquelas agradáveis de mar e sol. Isso, como um estado emergencial para sentir tudo, ouvir e falar mesmo que não haja motivos paupáveis. Aquele desagradável virtuosismo, marca de uma relação amorosa-forçada, em se prestar perante a moral e a ética desses tempos modernos me pareceu demasiadamente desgastado para continuar. Sim, são muitos traumas iguais a verdadeiros estupros. Ninguém pode contabilizar o mal que podemos fazer um ao outro. As palavras duras querendo ser previsão astrológica, um Nostradamus pífio, mesmo distantes, latejam nas paredes do quarto e pelas artérias quase entupidas de tanta emoção. O som pesado das teclas pretas do piano e um pouco mais de cordas leves servem-me de trilha para um som magnífico. Mas não é mais a mesma sensação.
Se falar de amores, de paixões ou até mesmo de frustrações, um nome terá que ser dado gratuitamente. Esse é um motivo de reconstruir um outra arquitetura concomitante as mudanças psíquicas e até mesmo, como diriam, patológicas. Pode ser uma simples falta de paciência diante do muro e das lamentações burguesas. Não se pode esquecer as lições no quadro esverdeado. Traçadas com um giz branco, hoje nem mesmo conseguem ser lidas, tamanha a desordem das lições-de-casa. Mais uma música estranha. Lembranças de um outono passado. Fez dois anos. Parece que foi ontem e tanto se passou. Em casa, as coisas mudaram. O registro do banheiro quebrou e a reforma ficou para depois. Não nego. Eu sou um mentiroso compulsivo. Deve ser esse o fator das minhas idas e vindas por ai. Lugares estranhos, noites permissivas e um ato corajoso de estampar na cara, uma cara de pau. Risos e aplausos.
Não é a mesma sensação. Repetir demasiadas vezes que não é a mesma sensação. Pior que isso, é sentir-se fora da ordem. Estar à deriva. Esperando um beijo roubado, uma fome voraz e deixar no lixo aquele antigo virtuosismo.
A cama? Continua a mesma. Um pouco mais quente, talvez.

Friday, September 19, 2008

Um pedaço

Semanas inteiras. A vela queimando e uma pequena falta de inspiração. Tudo desconexo. As noites ainda insones, os livros empilhados novamente na cabeceira da cama. Uma leitura atrasada. As músicas pop e saudade de algo clandestino. É fato. É fato que certos sentimentos acarretam a inspiração. Montanhas e mais montanhas de pensamentos descartáveis e os amigos ali. Uma delícia mesmo. O melhor momento de amizades. Todos eles juntos, sem cobrança, sem o fator do convívio forçado. Ah, assim é bom mesmo. E eu mudando meu estilo de escrever. Fragmentado, talvez.

Por enquanto é só mais um final de semana. 

Sunday, September 14, 2008

Ação de graças.

Entender alguns dias, uns poucos dias, faça sol ou faça chuva, Esses dias em que o cheiro da carne de panela, vinda do vizinho faz com que tudo pareça um pouco mais diferente. Todas as gritarias, portas batidas, sentimentos avulsos, versões musicadas e algumas peças de teatro, tudo escondido nos armários - no fundo, bem no fundo da gaveta.


Uns anseios estranhos. Umas batidas de corda quebrada e aquela volta no quarto. Passar a roupa da semana, arrumar a lixeira da bolsa-andarilha e ainda ter tempo de coar um café amargo e forte. Aí, vem a televisão ligada, um filme tosco me faz chorar. Uma lágrima que vem da cena entre duas irmãs - aquela tal reconciliação típica dos finais. O cheiro forte do feijão cozinhando e as campainhas tocando com as visitas de domingo. Um dia qualquer talvez. Uns anseios, pensamentos avulsos e, por que não, descartáveis. Arrumo a pilha de cds antigos e deixo a Billy Holiday no topo, caso precise. Arrumo os livros da Virginia e deixo-os ao lado do Cortázar. Endireito o quadro do Dali ao lado da cama e removo a foto Dela e coloco-a no criado-mudo. O abajur empoeirado, presente de uma amiga já distante, parece criar um outro ambiente. O telefone toca baixo, não ouço e não atendo. Dias comuns.


Tudo com um toque que inspira uma suposta sonoridade familiar: o cheiro da carne, o feijão, as tarefas domésticas. Mas ainda, por cima disso tudo, aquela ansiedade recente. As mudanças de pensamento. O jogo, a siesta e a música da Billy. Acendo o fogo, coloco a chaleira para esquentar a água e mais um café se vai; quente, amargo e forte: como em qualquer outro domingo...

Wednesday, September 10, 2008

Mala feita.

Eu vou ser clichê. Isso porque, a vida, uma hora chega perto quase que encostada. E algo começa a mudar. As noites de insônia, o fervor dos pensamentos não mais abstratos, mas realísticos. O sentido da vida. Aquela espera ou mesmo as aflições de algo fora do lugar. Tudo se movimentando de forma rápida, em círculos, um eterno vaivém. Sem pedir, as malas descem do guarda-roupa e se fecham. Postas a porta. É vontade de sentir tudo, tão rápido como começou. Bola da vez? Sem medos, arranhões ou sexos casuais. Um antigo gosto por paixonites estranhas e as flores mortas no vaso. Um retrato dela, a foto da sobrinha alemã, uma corrente do irmão distante e, claro, um beijo do pai ausente. Ali, naqueles lugares típícos dos sonhos, é ali mesmo que irei enterrar os pés. Não, sem antes, resolver as pendengas do mundo atual. E no lugar da última paixão, veio o vazio, o temeroso vazio que me faz esquecer todas as palavras que guardo e aí mal consigo escrever ou concatenar uma idéia sequer. Ouvindo Billy Holyday, fumando o último cigarro do dia e me sentido um pouco mais vulgar. Sim, a vulgaridade típica das vozes de cabarés e bares obscuros de datas remotas.
Eu vou ser clichê. Falar da vida e dos pormenores. Falar de árvores gigantes e poetizar o mar e areia. Vou ser ainda mais clichê. Rasgar tudo, queimar as fotos do passado já diluído em tantas outras paixões e amores. Até mesmo a caixa de recordação joguei na lixeira e o que restou, queimei como rito pagão. O círculo de jóia barata, foi-se num acesso de calmaria. Um grande pandareco tudo. Devo assumir, nada daquilo fez sentido algum. Talvez uma tremenda falta de tempo ou um erro demasiadamente prolongado. Vou ser clichê e arrumar pra mim um felizes para sempre e antes um era uma vez. Não nessa ordem. E tudo assim tão leve e suave. Algo mudou. Reza brava e muita, mas muita paciência com tudo. Caminhar entre mortos, ser alvejado por estranhas concepções, perder um dente, correr o risco de doenças venéreas, excesso de fumo e alcóol. Mas isso tudo, para um dia poder ser um grande clichê.
E não me canso de repetir.

Tuesday, September 09, 2008

mi casa, su casa

Gaston Bachelard foi um dos mais importantes filósofos do século 20. Sua obra revelou uma nova ordem para o pensamento filósofico, já que ela encontra-se em meio a revolução científica promovida pela Teoria da Relatividade de Eisntein. Assim, sua obra percorre o caminho do pensamento carregado pelo fervor das vozes da ciência moderna. No que diz respeito à epistemologia, é fundamental entendê-la como diurna, já que trata-se do caráter filosofico e rigoroso do pensamento. Como se diséssemos à luz da formulação.


E foi àlguns anos atrás que me deparei com A Poética do Espaço - La Poétique de l'espace. E naquele exato momento, na primeirá página, algo se tornou pulsão em mim. Tenha sido o pensamento lógico e linear de Bachelard, ou simplesmente o reconhecimento do espírito epistêmico, ali jazia uma parte de mim. De forma resumida, Bachelard assume a posição de filósofo moderno e se utiliza do espaço de uma casa como objeto de estudo. Ali, assumem os cômodos outras funções comparadas à nossa mente e ao nosso espírito. Portanto, para cada cômodo há um elemento epistêmico que o autor se utiliza para explicar as complexidades do pensamento moderno.


Ele foi um gênio. Não somente isso, Bachelard trouxe à filosofia uma ciência e uma nova ordem de pensar o mundo.


Um outro ponto importante para a compreensão do que chamamos "metodologia bachelardiana", é a sua noção de "obstáculos epistemológicos", tratado, sobretudo, na obra "A formação do espírito científico", de 1938. Bachelard propõe uma psicanálise do conhecimento, em que o seu progresso é analisado através de suas condições internas, psicológicas. Na sua avaliação histórica da ciência, o filósofo francês se vale do que chama de "via psicológica normal do pensamento científico", ou seja, uma análise que perfaz o caminho "da imagem para a forma geométrica e, depois, da forma geométrica para a forma abstrata". A própria concepção de espírito científico nos remete ao universo psicanalítico.


Nesse esteio, a minha leitura de Bachelard causou-me uma modificação. Poder enxergar concomitante aos tratados filósificos, um novo fazer da filosofia e mais do que isso, poder fragmentar uma unidade para em seguida assumir uma totalidade outra. Nada mais foi igual. As poéticas do fogo, e todos os tratados.



Naqueles instantes assumi uma outra postura. Pensar na vida e dar aos pequenos fragmentos do cotidiano um sentido outro. Percorrer rigorosamente os caminhos, dando voltas às peripécias e sentir cada presença do espírito na materialidade do sentidos. Essa ordem, esse pensamento, essa espécie de aurora ou do nascimento. Dar esse sentido; dos fragmentos e sentir a totalidade disso, que chamamos viver.

Friday, September 05, 2008

confissões na pista de dança

um cuidado de pele. sem acento. sem grafia, morfismos, estética, criação, gramática, lingüística ou semiótica. só um cuidado da pele, dos dedos, fronte e membros. essa espécie de resguardo. e é tão bom quando o passado retorna para mostrar como o futuro ficou melhor sem a efetivação do desejo. mas é atitude despeitada. atitude do peito, do sentidos, tudo posto no império do efêmero. os livros da hilda, as manias de deixar tudo com letra minúscula. sentimentos raivosos e um certo "Q" de quem ainda não entendeu. o doce sabor de cuidar. um cuidado de pele. de desejo. de real. de honesto. so, so true. that´s why my writtings are so odd. misturar tudo. línguas, gostos, meu gosto, your taste, my first taste, tout le monde, all around me, na sala, na pele, no rastro dos meus olhos procurando cada pedaço, cada fragmento de um outro olhar. something switter than this, more than me, you, your hands, my way to do. fucking my thoughts. só um cuidado da pele. do cabelo. da roupa e do cheiro. feel me no cuidado. minha pele. meu passado. no futuro de tantos presentes

Wednesday, September 03, 2008

in the arms of sleep

E nem sempre se vai assim, caminhando pelas paredes, arranhando e sangrando a ponta dos dedos. Essa idéia vaga de poder flutuar, dançar e escorrer cada centímetro do corpo, como se tudo pudesse ser feito tinta e pincel. É como estar sob efeito de alguma droga constante. Perde-se os sentidos, as roupas ficam diferentes e os sonhos tornam-se repetitivos. Na porta há sempre aquele aviso de entre. E nem sempre se vai assim. Pensando em tudo, revisitando cada lugar, cada olhar, toque e cada desejo que fez a boca salivar. Noites ou dias, o gole seco do pensamento impuro e mal dito. Nas paredes, as mãos presas em desejo masoquistas .Tapas na cara. Arranhões no peito. Mãos algemadas. Chupões no pescoço e nos braços. Tudo com uma leve dor de ontem. Uma leve dor do querer. Uma leve dor de sentir pulsar. A cada respiro, cada som dos meus ouvidos, cada sabor da minha boca, rejeito. Me transformo em algo assim, somente com um sonho por dentro, me fazendo viver, pisar forte e admirar formas infantis em nuvens de chuva. Nem sempre eu vou assim. Eu caminho entre os dias, corro na voz pesada e páro na porta. Mas é caminho de paredes. De lindas loucuras. Viver entre o existir antes e depois do desejo. Viver para ter a chance, para ter o gosto, o gozo, prazer de inundar meus olhos numa cor amarelada de mel. E meu sangue, meu doce sangue, jorra para viver de luz, para ser cor de sentimento. Mas nem sempre se vai assim. Hoje, caminhando.

Tuesday, September 02, 2008

Teus armários.

Nem sempre é uma possibilidade. Estar sempre diante de alvos, porque somos alvos. Uma flecha, um tiro, um resquício de pólvora. Mas na imagem do espelho, algo se perde. Algo se modifica e uma transfiguração emerge. Seria eu mesmo aquilo tudo? Seria eu uma manifestação quase assustadora; uma miragem, talvez? Quantas pessoas podem caber dentro de uma só? Eu poderia ser apenas uma fotografia estranha, tratada em programas de computador, ou seria só um negativo do antigo filme das máquinas analógicas. Não sei bem. Pensar em si e na imagem de nós mesmos. É como o livro de Pirandello. Aquele que somos para nós mesmos, não é o mesmo que somos para os outros. É um outro além. E ainda perguntam: mas esse sou eu na foto? Estranhamente, os fatos são outros. E quem tem forças para erguer mais um tijolo?
Eu penso em mim. Todos os escritos que me fizeram. É como olhar por uma lente. Um retrato outro. Procuro me achar, acho, distorço, penso em realidades e de como a vida se desfaz com palavras duras. Mas é maré mesmo. Sentir-se boiando, sem porto, sem cais, sem peixes na rede. Aqui, só a assombração do esquecimento. E nem seria tudo assim simples, se realmente não tivesse sido a simplicidade o motivo de tamanha desordem. Eu penso em mim e nos outros. Os olhos alheios. São eles que me interessam quando quero uma imagem fulgás. Por que eu mesmo, e sempre fui, machuco sem querer machucar. Pode até ser uma característica avessa. Ou até mesmo uma vontade de distorcer as imagens que foram se refletindo aos poucos.
Aí, vem a sensação de inacabado. Tudo na desordem, na imperfeita perfeição de quadros renascentistas. Uma escultura rachada. É como uma obra de arte sem porquê. Sem isso ou aquilo, peças fora do lugar e essa minha fotografia: eu, de chifres, a pele um pouco avermelhada, olhos fumegantes e um macabro apetrecho. Ninguém mais brincando de ser feliz, nem pintando nariz. O real da imagem. Pelos olhos, pela boca ou mãos.
Ninguém nunca soube, mas todo carnaval tem o seu fim.

Monday, September 01, 2008

Intransitivo

Eu vivo um silêncio. Como uma bolha, fechado, calado e silenciando as partes de um exterior ambíguo. É como uma lenda, um mito de verdade ora cruéis, ora desejáveis. E tudo movido pelo desejo, pela encarnação daquilo que almejo. Essa é a verdadeira luxúria: querer aquilo que não se tem. Eu vivo pelos impulsos fortes e latejantes do meu coração. Disparo e volta e meia acabo no mesmo lugar. Um silêncio profundo. Eu, de olho. Soslaio.
Eu crio esse silêncio. Abaixo o volume e deixo no meu mundo aquela voz rouca e forte. Ali, crescendo e germinando tudo o que se é possível germinar com um timbre de voz. Estremecendo as paredes do ouvido. Eu sou movido pela voz. Sim, tudo é encenação. Minha boca, meus lábios, meu corpo encostado em não-sei-quem. É tudo circo e pó. Ali, eu estarei sendo ainda um menino com idéias de adulto ainda em formação.
Eu vivo esse silêncio. Eu dou a ele uma voz que não a minha. Um silêncio de estar sendo. Ter sido. Sendo eu, prestes a desabar. Eu, criando bolhas de sabão e vendo-as estourar uma a uma. E tudo crescendo diariamente na cor do mel, no pincel - traço a traço. Nas noites de paredes e nesses sonhos tão acalentados pelo travesseiro. Uma viagem e ali estou sem malas. Eu vou com esse silêncio segurando nas mãos. Guiando pela multidão desconhecida que, sem saber, abre o caminho.
Esse silêncio em que existo. Em que crio. Invento. Vivo.

Friday, August 29, 2008

Fazia tempo

Estou numas de matar tempo. Sim, deixar que tudo tenha um curso certo. Talvez seja essa uma espécie de fórmular para controlar o espírito, ou simplesmente eu esteja tentando acertar antigas faíscas junto ao fogo. Lembrar de um antigo discurso sobre questões ontológicas e mesmo metafísicas. As antigas formas de pensar em tudo com um certo rigor.
Estou numas de ser rigoroso. Deve ser porque não há mais espaço aqui dentro ou fora para certas disparidades do viver. Mas ainda assim eu guardo especiarias para um dia dar tempero ao rancor e até mesmo ao esquecimento forçado. Nada por acaso, é fácil fazer de um dia simples algo a mais. Dar sentido ao cotidiano pequenino e torná-lo grande, como deve ser. E por que não se deixar levar, flutuar entre estrelas, astros e poeiras cósmicas. Esquecer enfim vestígios de roupas velhas, máscaras usadas e todo aquele palavrão. Murros na parede ou sentimentos avessos. Ou pelo avesso. Estou nessas ultimamente. Deixar de escrever e investir em outras coisas. Porque toda essa pulsão de vida que é escrever pode ser direcionada a outras áreas. Tornar-me-ei um escritor de todas as formas. Ser tudo ao mesmo tempo e sem sentido. Gostar, depois me apaixonar e amar incondicionalmente. Deixar evoluir mesmo o que no começo é tão gostoso e fácil, como um algodão doce. Talvez seja mesmo uma certa análise do discurso, tal como nos ensinou Foucault. Ou então, esquecer de tudo, e deixar que toda aquela pilha de livros seja consumida. As músicas tocadas. A dor, o ódio, o amor, a paixão e até mesmo aqueles sentimentos pequininos, todos eles tenham um sentido diferente. Empacotados.
Estou numas de deixar de lado. Sim, aquelas vestes estranhas e as amizades em ruínas. Deixar de lado essa parte da cesta. Ou nem é deixar de lado. É não mais fazer parte da vida e da corrente. E as minhas pulsões todas nas mãos, no olhar, no meu travesseiro, nos meus beijos e sonhos. Um texto deveras longo. Amanhã eu encurto tudo. Tornar-me-ei um escritor de muitas capas, fontes e páginas.
Fazia tempo que certas sensações não me visitavam. Hoje, vieram todas.

Thursday, August 21, 2008

Tesouras

Eu estou correndo. Por meio de cacos de vidro, pedras brilhantes e uma grama um pouco verde. Estou correndo para alcançar longos caminhos. Correndo contra vestígios perigosos de uma vida regrada. Correndo para saber se o céu é azul ou se tudo isso é mesmo uma das funções da minha retina. Sem saber ao certo em que velocidade tudo deve acontecer, eu acelero, freio em direção ao deserto florido. Porque no fundo as coisas vêm numa outra direção. Não contrária, mas uma direção adversa. E novamente meus textos voltaram a ficar confusos. Sem linha, sem rima, sem pé nem cabeça. Isso é sintoma de esquecimento. O esquecimento da razão. E vivo assim mesmo, numa inconstância de dias, de sabores, de quereres, de tudo.
Correndo para chegar perto. Um caminho de perto. Eu fiz esse texto no ônibus. Hoje, pela manhã, esqueci como escrevê-lo. E novamente, tudo parou de fazer sentido.

Tuesday, August 19, 2008

Clockwork

Mesmo que haja uma certa necessidade de sentir e escrever tudo, em qualquer momento. Uma urgência do corpo. E tudo é afetado. As insônias vindas da ansiedade como produto de uma má administração das pulsões e dos batimentos cardíacos. Sermões religiosos e os palavrões circundam uma perspectiva infantil de enganar o mundo com um único olhar. Diante de tudo: da mãe morte, do irmão distante e dos amigos enterrados em fotografias digitalizadas. As dívidas recorrentes de um mau uso das finanças e os travesseiros todos rasgados. Deve ser típico das insônias essa coisa de questionar o mundo quando tudo está adormecido. Reações alérgicas e o despertador atrasado como sempre.

Mas nem sempre se pode esperar do dia uma surpresa. Nem sempre uma carta ou recado distante, e-mails impessoais, ligações urgentes. Enfim, o cotidiano em sua forma mais chata, porém, deliciosamente patético. Daqui a pouco tudo se transfigura. Como se faz lá em cima, nuvens cinzas, roxas, pretas e a chuva. E mesmo que haja uma certa necessidade de tudo ser assim tão transparente e que as surpresas sejam fatos e não meros acasos, ainda restará noites mal dormidas, fadigas constantes e um certo ar de leviandade. Esse clarão de idéias, ou mesmo uma póstuma vontade de consumir o irreal. Tudo sem sentido, existindo e como partes de uma explosão. Sentimentos afoitos jogados na privada. A privada entupida. E nada assim tão bom: navegar pelas antigas calmarias da vida. O doce do cotidiano.

E mesmo que haja uma certa urgência em tudo, desligar o telefone, apertar end e sair como passo curto. Sem mais, nem menos.

Só a urgência de ser.

Monday, August 18, 2008

La revancha

"Não se afobe não que nada é pra já", disse o Chico, sábio, sambista e semi-carioca. Também outras analogias e metáforas estranhas surgiram. Falar de sentimento é sempre trabalhoso. Tentam e repetem. Falar de Voltaire, de Rousseau e outros. Tentativas frustradas de falar do mal na sociedade e da fragmentação de todos. Corrompidos, incapazes, desatentos e, claro, covardes. Aquela covardia que nasce pela falta de entender dois mundos. Sim, o medo pelo bom, o medo pelo correto e, digamos, pelo mais forte. Quando se entende de corações, mesmos os partidos, entendemos um pouco do Chico, do Voltaire, do Rousseau e até do Platão. Mas é sabedoria de butequim. Que dirá, daqueles que realmente entendem o próprio sentimento? Certamente, será uma filosofia embriagada, dita em táxis ou para estranhos vagando na madrugada.
Mas entendamos: falar desse assunto, seria, deveras perigoso. É quase como andar em terreno minado ou naqueles pântanos habitados por répteis. Deve-se entender muito de pouco, e pouco de tudo. Porque nem sempre o corajoso é o que fala. Ele pode ser somente a antítese; um fraco que se vê heróico. E mesmo esses fracos merecem mais palmas que o covarde. Aprendemos que coragem não é um sentimento, mas uma ação. Como em todos os casos, a cada atitude, cada pedacinho que se faz com aquela força, já é um bom começo. Eu, por exemplo, me transformo, mesmo que em medidas minúsculas, a cada avanço, a cada quebra de medos e em todas as vezes que mudo um pouco de mim. É diferente ser maior. Talvez, diriam, mais homem do que antes. É instinto de sobrevivência. Mas aí viria o Rousseau para dizer outras verdades. Essa tal corrupção nefasta, mas involuntária. E se já nascemos corrompidos, por que não corremper aquilo que o exterior não conseguiu? Sim, corremper, destruir, roer certos fragmentos da covardia, do insulto moral que foi imposto. Talvez seja essa a espécie de liberdade que tanto procuramos: ser nada, ser corrompido e ser nada, sendo tudo o que se pode ser ao mesmo tempo. Sim, talvez seja essa a chave. Não ser nada e ser tudo. Um algo deleuziano, eu diria. Um produto de filosofia, sem política ou religião. Nada de riponga ou pé-sujo. Ser por si só, e isso bastar.
Alguns diriam que seria uma pura loucura. Outros, apostariam num anarquismo psicológico. Eu digo que não é nem isso e nem aquilo. Ao Rousseau, Platão, Chico e a corja toda, eu diria que seria a revanche.
A revanche de nós, contra nós mesmos.

Saturday, August 16, 2008

Picnic

Quando esqueço, por momentos, tanta coisa que se passou. Memórias do passado, brincadeiras de criança próximo ao rio e até mesmo os primeiros momentos da adolescência. Se fosse uma religião, abdicaria da carne, de deus, das santificadas expressões e, no lugar, daria um clarão de idéias aurívoras. Mas aqui, enquanto o frio não toma o seu lugar, enquanto não para de chover e até mesmo as insônias, eu deixo estar tudo quieto; adormecido.
Nem mesmo gritas minhas idéias de filosofia, embriagado num táxi, ou explicar a importância do movimento romântico no Brasil. Falar de Alencar e dar a ele sua importância. De nada resolve. Adormeço com os livros ao redor e um certo ar de tranquilidade. No meio da noite, o relógio anunciando 04:26 e eu tentando interromper sonhos e ver pela escuridão um pontinho de luz. Os sonhos do passado e aqueles rastros abençoados. A tudo abdico. Escondo os quadros e quando esqueço, por momentos, a pressa dos dias, volto a dormir.
São pequenos cortes. A ressaca matinal, a dor de cabeça e os vultos na memória. Escrever sobre tudo, para tudo e todos. Dedicatórias invisíveis e tudo a borbulhar. Das xícaras solitárias, da família distante próxima ao mar e meu desejo por ondas maiores e água salgada. Nem mesmo os amigos ficaram pra ver os fogos coloridos. O lábio inchado do beijo inesperado. Rimas afugentadas e um certo calor em pleno sábado.
Por momentos deixo estar tudo. Ponho de lado a mão direita. Tudo quieto. Adormecido. Por momentos.
Tudo adormecido.

Thursday, August 14, 2008

Se eu contar.

Quando criança e um teco da minha adolescência, eu costumava me sentar e observar minha mãe: sentada, com o cigarro acesso até a metade, as pernas sempre cruzadas e com um certo olhar de desdém para a televisão. A cinza comprida quase caindo segurada com firmeza pelo braço apoiado. Talvez essa seja uma das mais fortes imagens que eu tenho dela. Não a composição dos elementos, mas a postura das pernas cruzadas, do cigarro e, principalmente, da forma como ela olhava para as coisas - a forma como ela olhava o mundo.
Com isso eu cresci quase como um molde. Eu fui me fazendo tal como ela. Um certo olhar desdém, o cigarro em uma mão e as pernas cruzadas. Como estou aqui agora. E toda vez que me pego, correndo, pelas chamas ao me redor, me lembro que essa imagem, essa postura está em mim como qualquer outra parte do meu corpo. Tudo o que sou. O meio homem, os fortes impulsos femininos e a pouca razão que devoro em minha mão direita. Esse meu olhar de quem não se interessa pelo mundo, mas que no fundo olha para entender um pouco de si. E até mesmo nos meus dias de embriaguez eu sei que acabo transformando meu rosto no dela. Ninguém foge daquilo que se é. Algo a se aprender, não com os livros, mas com a memória do espírito; essa memória que nos faz, move e nos carrega para uma certa identidade forçada. E não menos importante, isso que nos faz ser o que somos. Esse meu ar de desinteresse. Talvez ele seja um alvo, quase como um destino. Um trilha mesmo. E tudo assim tão claro. Ela sentada, fumando o meio cigarro e as pernas cruzadas. E mesmo o jeito de rir, eu herdei. O gosto por Chopin e a impulsividade típica dos mais quietos.
E anos depois, ainda quando tento descobrir em flashbacks um pouco do que eu sou e das minhas metades. acabo me deparando com essa imagem, com a postura. E não obstante, deixo o cigarro em uma mão enquanto levemente cruzo as pernas. Tudo isso, claro, muito inconsciente.

Monday, August 11, 2008

Sinnerman

As corridas estão abertas. Toda a neve derretando como se o sol não fosse só o calor, mas algo além quase como uma luminosidade mágica. Tudo tão cheio de nuvens e numa velocidade incrível eu ajusto a calça e tento pentear o cabelo. Das semanas intensas e dias corridos, aquela selvageria e um estado emergencial. As providências do dia. Uma chatice. Nem cura inventaram. Textos sem nexo ou, se preferir, nem pé nem cabeça. Certos sintomas de esquecimento, sonhos inadiáveis e aquele velho inconsciente alertando com luz vermelha o perigo eminente.
Ai, eu me perco. Me perco vagando entre tantos mundos, tantas idéia, dentro e fora do meu corpo. Sim, pensar demais é sintoma de carência. Sim, pensar demais é motivo para falta de ação. Não digo dos poemas. Ah, os belos poemas de Hilda, Sophia e até o pobre e esquecido Pessoa. Minhas leituras atrasadas e um quarto semi-arrumado. Livros desorganizados e uma antiga mania de sentir-se deprimido. Seja nas manhãs, seja nas noites, um resgate sensorial de tudo o que se passa. Seja como for, aqui ou ali, é preciso um certo ar de leveza. E nem é preciso muito. Talvez uma bebida, um pão velho, mas que tudo acabe no riso, no sono pesado...
As corridas estão abertas. Nem sempre é o que se esperou. Os desejos de criança mimada e as vontades adolescentes. Aquele romantismo rouco, clareado por idéias literárias. Tudo, mas tudo mesmo colocado num quadro renascentista. Nem mesmo Sartre seria tão niilista para acreditar em túmulos ou romantismos exacerbados. Aqui, preza a paciência e, claro, a tal da leveza. Se as corridas estão abertas, basta trocar a ferradura e trotar.
Na chegada, é só cortar a faixa. Que nem sempre vem junto de presentes ou datas especiais.

Sunday, August 10, 2008

Conto.

Encostou-se na árvore, como se está estivesse erguida para o seu corpo cansado. Esteve por horas andando a esmo. Segurou-se em muitos pensamentos, olhou o rio, notou que os peixes descansavam sob a sombra projetada pela imensa árvore. Devia ser algo secular, pensou. O dia estava quente, demasiadamente sufocante, como tudo aquilo que havia dito na noite anterior. Era como se as palavras pudessem assumir uma forma corpórea e se misturassem ao dia, ao sol, ao calor e aqueles pássaros que sobrevoavam também sem rumo. Segurou as mãos na tentativa de imaginar que fosse outra mão e não a sua própria. E ali, naquele tronco, encostado pensou que poderia resolver todos os seus problemas. Era falta, que na imaginação modificava-se como presente. Todas as recordações lhe vinham como ondas gigantes de cenas, choques, espantos e sonhos irrealizáveis. Com o dia agitado, tendo acordado cedo, sentiu que naquele lugar um mundo estava se formando; a cada lágrima, uma criação e a cada suspiro um desmoronamento. Por que não escrever poesia, interrogou-se já quase deitado na grama. A poesia poderia de certa forma, colorir e preencher algumas formas tão vazias dentro de si. O telefone poderia tocar a qualquer instante com uma notícia vinda de longe e eu poderia mudar-me para o interior, para alguma cidadezinha com poucos habitantes e viver só, do trabalho e do corpo. A realidade era somente aquele momento, que bem poderia ser a felicidade, já que acreditava que a felicidade era apenas um segundo em que o corpo se desprendia da alma. Lá fora, ouvia o barulho ressonante e grave dos carros.

Os pés doíam. O calor com o atrito do tecido áspero do sapato provocaram bolhas no canto do pé e na sola cansada. Tirou o sapato e quase como um ato religiosamente sagrado, encostou o pé na terra úmida. Era um alívio, como se a terra estivesse lhe retribuindo um favor. Seus pés se misturaram aquilo que lhe afagava o corpo inteiro. Imaginou, já maravilhado com a quietude daquele momento, que enfim chegaria ao céu e encontraria um pedaço de terra com uma árvore de tronco grosso e forte para deitar-se na eternidade, pois aquilo já era um pedaço do sentir-se para sempre. Em verdade, não poderia sentir-se de outra maneira.
Uma voz lhe dizia que o caminho era aquele mesmo. Já nem mais pensava nos carros, no barulho e na fumaça vinda do asfalto quente. Mesmo que houvesse uma passeata política lá fora, jamais tiraria seus pés da terra úmida. Estava misturando-se, aos poucos, àquele lugar. Poderia morar ali. Poderia casar-se, plantar e jamais ter que encontrar outro lugar para descansar.

Thursday, August 07, 2008

Quinta.



Em 1656, Diego Velásquez espantou seus admiradores ao apresentar La Família de Felipe IV. O espanto não decorreu somente da iluminação característica ou da introdução de um auto-retrato e sua técnica de quadro dentro do quadro. Havia ali, dentro de toda a perspectiva algo "estranho". Sim, ali mesmo, dentro das belezas iluminadas de um gênio havia um sopra quase irreconhecível: um anão. Em meio as belezas da realiza, o disforme ser aparecia, olhando para o espectador quase como se quisesse se apresentar. Isso, em 1656. Aquele anão, assustador, atravessou os séculos de quadro em quadro, se movimentou pela música e por todas as esferas da chamada arte. Ele tornou-se o espelho. A antítese e o igual. Dele, saímos todos. O horror pelo disforme. Esse mesmo personagem pitoresco, viveu entre nós, se instaurou nas classes dominantes e transformou a cultura do homem contemporâneo. Foi com ele, um simples anão, que aprendemos que o feio pode estar no bonito, mas mascarado, iluminado, quadro a quadro.




Alguns muitos anos depois, ainda nos espantamos com o tal anão. É ele, os travestis, as drag queen, clubers, góticos, emos, roqueiros, metaleiros, afro-descendentes, orientais e, claro, os transexuais. Hoje, esse ano ganhou nome nas manchetes. Ele se chama Thomas Beatie, uma mulher norte-americana que decidiu engravidar depois de uma mudança visual de sexo. Thomas, deu à luz a seu primeiro filho recentemente. Americanos, raivosos, protestaram. Outros elogiaram a atitude e outros resolveram não se pronunciar. Um verdadeiro circo. Um quadro de Velásquez. Mesmo o anão estando na sala a nos fitar, fingimos que ele não está lá. Ora, se permitimos a cirurgia plástica, aos tratamentos pesados contra o envelhecimento, a redução de estômago, por que não aceitar Thomas como uma família? Sim, os desajustes parecem ter crescido desde 1656. As formas contundentes da moral enraizadas na cultura do ocidente. Podemos alterar o nosso nariz, afiná-lo, remover a gordura e tirar linhas de envelhecimento, mas nunca, nunca, podemos assumir o tal anão que existe dentro de nós. Tirá-lo do quadro é uma infamia. Talvez um crime em alguns países. Essa força controladora que nunca nos deixára aceitar o Samson de Kafka ou mesmo o Thomas norte-americano. Sim, Nietszche foi um visionário e Foucault o pai do pensamento moderno. Somos previsíveis. Tirar o nariz sim, homem com barba dar à luz, JAMAIS!




De 1656 à 2008 algo deveria ter mudado. A perspectiva de uma possível quebra da moral religiosa, ou até mesmo esse anão que nos ultrapassa nas salas cirurgicas. Algo deveria ter mudado. Não somente aos norte-americanos, mas ao pensamento e, por que não, ao espírito humano. Uma linda criança, sortuda talvez de ter uma família com os anões que um dia serão o ponto de fuga de um quadro. Pensam: o que será dessa criança? Não podemos prever, mas podemos afirmar que seu mundo será desenhado fora do quadro, como se o seu mundo pudesse enfim, ser o começo de algo.




Uma família.

Wednesday, August 06, 2008

Quarta.

A saudade quase como uma tristeza, vinda de lugares distantes, nem sempre pretende ser tema nem aresta. Ninguém sabe das melancolias e virtuosidades. Crianças mesmos, brincando de jardins e erguendo as mãos para o céu. Ó, deus Apolo que nos traz para a vida adulta. De pureza em pureza somos, ainda, crianças. Idéias juvenis. Eventos mal consagrados. Solos que enterramos sonhos e sonhos, num repetir quase canônico. Uma soda limonada para o Diabo e aquela quentura, um ferver de sentimentos como se à deus nada pertencesse. Mais um gole de coca-cola. Arco e flecha. Apolo, leve-nos para a vida adulta. Juntamo-nos a Ártemis num parto de gêmeos. Na ilha de Delos, nós todos, crianças, adultos, Diabos e Deuses.

A saudade como uma tristeza. Uma bola de chiclete masgado, quase sem saber. O olhar doce e escondido por trás de uma lascividade absurda. Nos cantos, nas pequeninas mãos, o doce sabor de soda limonada. Inventores do desentendimento, nem mesmo siameses são capazes de decifrar o pensamento. Juntos na vida, como terra e fruto. A casca da árvore. E ainda jogamos pedra no vidro do vizinho. Apolo! Leve-nos para a vida adulta. E isso, rogando para os Deuses, tentando soltar as mãos do Diabo. Ele, que nos ferve em calda quente de doces ilusões. A saudade dos tempos de maldade.

Rogamos ao senhor dos ventos. Aos deuses na espreita por nossa vil brincadeira. Como uma prece, pedimos a Apolo, um sopro de vitalidade. As bolhas de gás da soda explodindo na cara Dele. Solte-nos a mão, grita a criança. Ártemis vem pela floresta. Nos caça: arco e flecha.

Mais uma soda, com ou sem limão e nos deixe ir, além da maldade.

Tuesday, August 05, 2008

Terça.

Artemis, a mais pura e casta das deusas do Olimpo, calmamente passeando pela floresta deparou-se com a sagaz raposa. Longos e dourados momentos, como se somente existissem dentro de uma certa magia de ser e querer. A magia de rosas vermelhas e túmulos sagrados. Toda forma de reza, ali presente. Cautelosa, Artemis aproximou-se da raposa no intuito de advinhar-lhe suas intenções. "Diga-me o que queres bicho de pêlo vermelho". A raposa, sorriu, e entregou-lhe uma linda caixa dourada. "Trago a vossa deusa um presente dos seres da floresta".
Por alguns breves momentos, a janela aberta, o céu negro e pesado. Logo, tudo desabou. Tudo veio abaixo. Pesadas gotas e ali em cima tudo se despedaçando. No breve momento, a mão no bolso e uma vela acessa em cima da mesa. Carência de mortos vivos e esquizofrênia. Artemis, desconfiada, levou a caixa para seu irmão Apolo que a aconselhou se desfazer do presente abrindo-o junto do bicho vermelho. Armada com seu arco e flecha, a deusa lançou-se furiosa na floresta em busca do animal. "Diga-me, raposa-vermelha, que trazes essa caixa?". A raposa, surpresa, sorriu. Artemis, percebendo seu medo, flechou o animal-vermelho na pata. Preso ao chão, a raposa sorria num grito de desespero. E assim mesmo, o quarto trancado, as roupas amontoadas e um vermelho nas costas. O corpo ainda dolorido, a garganta quase seca. Todos os pensamentos de volta ao toque da baiana. Ninguém se separa do mar. Ninguém foge das ondas, do sol e dos longos cabelos pretos de Janaina. Tragam os presentes. Barcos azuis. Rosas brancas e preces desesperadas. Com tudo, a chuva tombou o mundo. Abriu a cova dos fracos e deitou até mesmo os corajosos.
Diz o mito que Artemis, a mais casta e pura das deusas do Olimpo, transformou a raposa em pó vermelho e a jogou dentro da caixa dourada. Morados e selvagens da florestas ainda ouvem suas risadas tortas e cínicas. Vigilante, Artemis caminha pela floresta penetrando seu olhar por entre folhas e pedaços de pau. A caixa, escondida entre suas vestes. Ali, no canto mais obscuro, no fundo dos olhos, a imagem do guerreiro que um dia fui. Das sóbrias noites que passei escrevendo e sem nenhuma resposta, abandonei o gosto pela leitura diária. Troquei até mesmo os anéis e queimei as fotos. A família distante crescendo e aos poucos se esquecendo que sou tio ou irmão. Dos outros laços me desfiz, como o temporal. Ninguém se separa do mar. Do pó vieste e ao pó voltarás. Diz o mito: ninguém se separa do mar nem das vontades Dela. Minhas imagens tão lúcidas, meu quarto organizado por livros, recordações e novas montarias. Minha cama feita, lençóis lavados, travesseiros com restos de alguém. O passado, morto. Como se tudo pudesse um dia ter um recomeço com sal e água morna do oceano. Perfumado com alecrim e jasmim. Minha pequena coroa de santos e divindades. Eu, louco que sou, desfaço aqueles nós e jogo-os no mar. Pra Ela. Minha cor, minha força e minha fraqueza. O buraco na alma. Ninguém foge do mar.
Diz o mito que Artemis guarda por debaixo das vestes a pequena caixa dourada. Dentro, um pó vermelho, semelhante ao urucum. Os pêlos da raposa que um dia tentou enganá-la. Ali, dentro da caixa. A cova daqueles que adentraram na floresta. Artemis.
Diz o mito.

Monday, August 04, 2008

Segunda.

Diz o mito que Artemis, deusa da caça e da serena luz, é a mais pura e casta das deusas. Diz o mito que seu pai Zeus a presenteou com um arco e flechas de prata. Diz o mito. Todos os recomeços. De segunda até outra data marcada no calendário. Ela, a deusa da caça, as florestas e seu exército indomável. O mesmo diriam de Iemanjá. Dos santos, dos mitos, dessa força que vem da natureza, do humano e até mesmo do sangue. O meu sangue. Composto de tudo o que vivo. Daquilo que me faz e desfaz. Dos minutos próximos, de tudo que vi. Das flechas que erram o alvo. Eu vou, aos poucos, juntando o exército.
Como a luz prateada da lua, Artémis percorre todos os recantos dos prados, montes e vales, sendo representada como uma infatigável caçadora. De flechas, vaidosa como é. No seu recanto tão saboroso, ela recruta. Todas as indas e vindas. As falsas intenções e mesmo o cinismo pouco mascarado. Ninguém pode com o mar. Nem mesmo as ondas ou a orla da praia. Ali mesmo, tudo que se joga, volta. Tudo o que se apronta, Ela vê. Nos barquinhos festeiros, garrafas, cartas mal intencionadas. Ela retorna. Com força de natureza e com a maldade dos céus. Elas, em mim, como se eu fosse construído como um mito único, como a soma de todos os medos, todas as forças. Na minha pequena floresta. Nas minhas flechas e mesmo no meu entendimento, onde tudo e todos passam, deixam vestígios. Nada que me cerca. E ainda não sabem que vejo, sem abrir os olhos. Assim, como idiota ou qualquer coisa que valha. Me cercam os cinismos e as más intenções.
Ela, a senhora da caça, a mais casta das deusas. Ela que matou Orion e pediu ao pai que o transformasse em constelação. Ela. Eu aqui, rindo dos pequenos soldados soltos. Animais, que circundam a floresta sem saber de nada. Que navegam pelo mar a procura de si mesmos.
Flechas e arcos. Diz a lenda que nunca traia o mar. Traicoeiro, ele retorna. Nunca duvide de Artémis como fez Apolo. Sofra o escorpião na eternidade da galáxia. A mais casta das deusas do Olimpo. Também a mais mortal.

Friday, August 01, 2008

You dont get summer for nothing

A gente sempre acaba voltando. Seja para casa ou para essa antiga tela. A gente sempre acaba voltando. Volta e meia. Pulos aqui e ali. Nunca paramos para olhar o relógio distante na parede. Os minutos correndo. Um pouco além da conta. As estrelas do céu, uma a uma, se apagaram e o relógio despertou. Num segundo. Tudo virou uma pedra. Talvez rocha, E deixar registrada a lembrança.
No quarto velho e ainda pouco alimentado por sabores diferentes. Aqui, jaz o equilíbrio eterno. Sem mais, nem menos. Entender o efêmero e as questões ontológicas e metafísicas. Tudo isso junto num grande pacote, embrulhado num papel vermelho e um laço mal amarrado. Mais um cerveja e o corpo dormente. Querendo cama. Querendo o sossego, dentro do desassosego. As grafias incorretas e pouca, mas muito pouca matemática. Sem tempo e sem ajustes de ponteiro. You dont get summer for nothing. Assim, como mito, como pedra. A semana rápida. Sem licença. Eu deixando pra trás hábitos, manias e unhas roídas. Rosto lavado e creme para as mãos. It´s a fire. Os sonhos molhados, dores de um passado mal construído. Leves pontadas na´lma. Aqui, jaz o eterno. O feliz e infeliz. Tudo junto. Um grande embrulho em papel reciclado. Volta e meia e sempre voltamos para a origem. Seja p útero ressacado ou um simple soluçar, volta e meia, voltamos. O eterno retorno. Sempre. Passos largos e um vontade incontrolável de deitar e dormir.
A gente sempre acaba voltando.

Tuesday, July 22, 2008

37822:43

Tem sim. Um fio longo, talvez dourado, um pouco achatado, mas fino, bem fino. Tem sim. Uma tesoura, uma faca e mesmo um maçarico. Tem sim. Tem como cortar, sem muito esforço, só de encostar. Tudo tem uma certa motivação. O calor motiva a chuva, a fumaça a tosse, a mentira o desastre. E é tão curto. O momento, a razão. E eu poderia falar disso horas a fio. Mas, pra que precisamos tanto falar de verdades se, no fundo, o que importa mesmo é dormir bem?
Tem sim. Esse mesmo fio longo, meio dourado, um pouco achatado. Ninguém nunca soube como utilizá-lo. Ele poderia tecer uma bela malha, ou quem sabe costurar uma roupa velha e até mesmo poderia ser utilizado para fazer ligações telêfonicas. Sim, ele tem muitas utilidades. Ninguém nunca soube usá-lo. Mas, como todas as coisas do mundo, ele tem o antagonista. Já falei das tesouras. Um pouco mais afiadas, elas passam e levam embora todas as fibras. É questão de loucura. Esquizofrenia acelerada.
Sim, uma boa noite de sono.
E até para isso serviria o fio: tecer, ainda que quebrado, uma boa noite de sono.

Come, as you are.

Eu venho falando muito em sonhos. Tentativa frustrada de entender pouco, sobre tudo. Eu venho sonhando muito com Ela. Decifrando códigos, mandando sinais, seja lá o que for. Eu guardei tudo na mala; eu digo, sem medo, que guardei tudo e tranquei. Porque pouco a pouco nada foi cabendo. Mas ontem eu pensei em tanta coisa. Atordoado, sonolento e pouco, mas muito pouco concentrado eu me deixei divagar por tudo. Senti tudo, sob todas as formas, como diria Pessoa. Mas chega de falar em poesia. Isso é pra outra hora. Talvez seja cedo demais para trazer poemas para dentro da mala.
Mas eu venho falando muito em sonhos, declarações e esperanças. Motivos escorregadios, textos literários e mais um monte de porcaria. Provavelmente porque eu quero ser decifrado. Ou estou tentando decifrar o cubo. Mas Ela me disse tanta coisa essa noite. Me lembro pouco do que se passou. Dessa vez, sem batuques. Eu e Ela, como ocorria no começo. E ainda acordei com a sensação; e eu vim de verde. Será que precisamos saber de tudo? Saber, entender e compreender tudo o que se passa? Aviões, carros, fontes naturais, ecoturismo, verdades e mentiras. Precisamos? Sorte, talvez, daqueles que de nada entendem. Eles fecham os olhos, dormem, acordam. É só dar corda. Sorte deles. Nem precisam pensar nisso ou naquilo. Eles vivem. Eu, ao contrário, tem um hábito sensível de querer entender e saber tudo. Se tenho uma leve dor de cabeça, preciso do motivo. Mas para Ela, isso não tem razão de existir. Mesmo que eu saia voando pela janela nesse exato momento. E eu vou descendo ao centro, como se quisesse parecer planta ou raiz de planta.
Eu venho falando muito em sonhos. Talvez eu esteja sonhando muito. Isso, Ela me disse. E por mais gostoso que seja, sonho é sonho.
Uma hora a gente acorda, abre os olhos e tenta levantar.

Monday, July 21, 2008

Back to Black

Da vida nada se leva. Dos dias tortos, das vontades mal entendidas. Nas embarcações sempre tão guerreiras, sobe o mais forte e sábio. Os outros, que fiquem na praia. Assim poderiam dizer. Tantos ditos populares. Tantas maledicências. Indecências mesmo.
Explicações insuficiente para dar luz aquilo tão misterioso. Jogadas palavras fora, tantas noites de inspiração, tudo revirado no armário, livros, roupas, sapatos e palavras. Tantas que voavam pela janela. Você era uma fonte; transbordava-me inspirações, imagens, saberes. E eu era como a própria noite. Quieto, sereno, negro. Essa minha casinha de cartas. Estou num mal dia. Mal humor talvez, coisa que sabe que não tenho. Dor de cabeça e sono. Será só isso? Enquanto o sol vai indo, aos poucos, pelo dia, pareço perder pedacinhos.
Estou todo de preto hoje. Foi despretencioso. Não poderia ter combinado mais.

Sunday, July 20, 2008

14:23

Fazia tempo que eu não chorava. Sem motivos afetivos, sem alegrias ou tristezas. Chorar para dar sentido ou seja lá o que for. Num domingo qualquer, num dia ensolarado e cheio de cheiros no ar. Deixar apenas que tudo venha como soma de todos os medos e todas as vontades. Sim, como animal. Talvez como besta, deixar que a lágrima seja uma fúria, fúria das garras. Ah, como a besta que arrancou pedaços da vida, lascas de felicidade e depois, como bicho selvagem, descartou tudo, a vida, os sonhos e as unhas quebradas. E tudo foi querido. Os olhos encharcados e o mundo visto através da água, meio embaçado, sem sentido, mas perfeitamente construído como algo a parte.
Num domingo qualquer, indas e vindas, chorando ou não. Largar a fúria na rua. Largar as luzes e as cores e deixar vir a besta, arrancando as beiradas da vida e tentando fazer a voz ser mais que o corpo. Num domingo, nesse domingo, chover o dia, o mundo, chover o corpo, como se a fúria deixasse de ser animal para tornar-se o que deveria ser: apenas uma pessoa comum.

Saturday, July 19, 2008

Wake Up

Algumas horas de sono pesado. Jantar, encontro, presente. Sentimentos voando pela janela, saindo pelo poros e aquela nossa conversa. Se existe um eixo para as metáforas, porque não existiria o nosso próprio? Somos mesmo uma metáfora mal utilizada entre uma palavra e outra. Somos feitos assim, vírgulas e pontos finais. Nos escrvemos diariamente, pela ponta da caneta e nas idéias tão confortantes. Virtuosos transformamo-nos em laços queridos; naquela forma mais perfeita de escrevemos, um no corpo do outro. Seres de planetas vizinhos. Nos sonhos, somente nos sonhos podemos dizer que a metáfora faz sentido.

Fazia tempo que não andava de metrô devido a uma pseudo-claustrofobia. Sabia as estações de cor e salteado. Tinha decorado nos passeios com a minha Mãe quando criança. Depois de muitos cigarros, anseios e idéias, cheguei em casa. Tudo parecia diferente. É essa sensação monstruosa de não saber onde chegar. Deixei tudo na mesa. Fui pra cama. Só assim se termina um dia. No encontro com o nosso eixo, aquilo que nos faz o que somos.

Aquilo que pode enfim nos refazer. Açucar e olhos fechados.

Friday, July 18, 2008

I just wanna be...

- Nada demais. Os encontros e desencontros como se fossem obra de uma jogada. É, pode ser. E nunca poderei concordar que cisnes são mais bonitos que pássaros. Eles não têm aquela coisa de ser altivo. Mas sabe, eu posso ter inventado esse jogo, um pouco bobo, de ir e vir; foi assim que eu aprendi, aos poucos, a mexer com serpentes e enfiar a mão num balaio cheio delas. Nossa, sim, por você sim. Eu arriscaria deter uma parede de fogo se ela ameaçasse arrancar-lhe um pedaço que fosse. Ah, eu pareço assim e toda vez que eu ouço essa música eu sinto como se fosse uma espécie de transe psicodélico. Meu deus, nem precisava tirar tanta vantagem de tudo. Por que diz isso? Sabe bem, como ninguém, de tanta história, tanto relicário velho que penduro no pescoço e até as cartas rasgadas já mostrei. É, sim, como se eu entregasse toda a porcaria escondida nas suas mãos. Pára. Não. Isso mesmo. Não é fácil dizer essas coisas, mas só assim eu não me sinto num divã. Essa música não para. Você gosta? Não, não. Tira esse disco. Troca, por favor. Ordenar tudo isso num pensamento único, depois duma bebedeira, agora de ressaca, é deveras difícil. Poxa, coloca a sua mão no meu ombro e vai. Ou melhor. Pára, não faz essa cara. Eu peço: troca esse disco. Quebra essa vitrola que eu mal consigo me manter de pé ouvindo essa poeira tocar no ar. Eu estremeço só de pensar. Sim, meu corpo entra em queda de vertigem. Eu escolho os santos e levo-os para cama. Meu português ruim. Mas porque? Deixa isso pra lá. Você sabe bem o que eu quero dizer. É pouco. Eu mesmo mostro caras e dentes; deixo transparecer esse véu negro que me cobre como se fosse translúcido e feito de cristais pequeninos. Pequeninos? Por que você está rindo. Talvez eu seja pequenino, como você disse, cheio de mimos. Eu já disse. Está tudo aqui. Sem chaves, sem amarras. Por que diz isso? Estou erguido, como monumento. E seu. É. Não...Pode ser. Quem sabe? Sim, você sabe. Sim! Olha só, enterra seus demônios. Agora o céu se abriu. Sem anjos e guirlandas. Só o céu. Azul como ele mesmo. Troca esse disco. Pára. Isso, ai mesmo. Deixa isso pra lá. Você sabe bem o que eu quero dizer.


- ...

Thursday, July 17, 2008

I fuck myself

Quantos brilhos, luzes e facetas de diamante puderam aparecer, apareceram. Ali mesmo, no cartiado, num batuco quase ensurdecedor e tudo estremeceu rapidamente. Foi como uma implosão de sonhos. Todos, ao chão. Mais calmo e sereno vieram conversar, inclusive Ela. No meio de tudo, da gira, dos santos e cheiros eu vi refletido ali uma imagem, talvez um futuro - coisa do destino. Todos ao chão. Eu deitado de bruço. Todas as luzes acessas e um baita estrondo.
Ali, nos sonhos, nesse mundo tão complexo e labiríntico; ali mesmo onde realizamos o que não se pode realizar na vigília. Sonhos eróticos, materialização de desejos, inconscientes perdidos, nuvens coloridas e beijos. E teria sido um crime acordar no meio do som. Da fúria que descobri necessária para dias de trovão. Tentei dormir com duas folhas sulfite e uma caneta. Tentei escrever um livro. Em vão, adormeci e quase me furei. Quantos brilhos precisam para se ter um clarão? Mas do sonho nada se leva. Somente as sensações, os descasos e a paranóia de tentar interpretar tudo a nosso favor. Sonhar acordado, como Ela diria.
Mas no meio disso tudo, da luz, do brilho, do batuque de gira, dos santos possuídos, a revelação. Pelo sonho, pelo consciente, tudo capaz de revelar ali, logo ali, que os tão românticos sonhos tem um fim. Logo ali, nem virando a esquina, mas ali no fim, a explicação.
Deita e dorme.

Wednesday, July 16, 2008

Depois de um tempo

Nada mais parece ser novidade. As mesmas palavras estranhas mal encaixadas numa sentença e aquele velho truque de discursar sobre o amor. Nada mais parece novidade. É perfeitamente compreensível. Depois de algum tempo de tantos recortes aqui, lá, as coisas ficam no retalho, na colcha velha da mesma cor - talvez um pouco descolorida. Os padrões se juntam numa cestinha de vime e podemos inclusive sortear um bilhete que dirá o que devemos fazer.
Nada é novidade.
Depois de um não, depois de um sim, de histórias incansáveis, de amores frustrados, mortes, insensos, livros começados e não lidos. Aquelas músicas que retornam e tentamos dar uma outra cara dizendo que é coisa do momento. O momento mais insensato. Nada mais é novidade. Não há como parar de repetir: nada mais é novidade. Triste ou não, deve-se olhar e dizer isso incansáveis vezes. Nenhum sentimento parece novo depois de ter sido apedrejado. Infeliz? Que cabe agora dizer isso? É só porque se há uma repetição é porque a novidade acabou. E quem dirá que vamos sofrer se já sabemos exatamente qual será o final da história? O lobo come a vovó? Não, o lenhador aparece e o mata antes disso. A Cinderela se casa, a Branca de Neve....e assim por diante.
Quanto a nós, vivos fora das história, só resta colocarmo-nos dentro daquela garrafa e irmos ao oceano afim de que alguém, talvez distante, nos ache e faça de tudo aquilo que deixamos para trás, uma grande novidade.

Tuesday, July 15, 2008

370

Os meus inimigos todos à postos. Armas, dentes cerrados e olhares alegres. Todos. Em frente, rumo à trincheira. Todos os meus inimigos repetidamente ansiosos pelo momento da grande descida. Seria somente isso. A bomba no ar, tentanto queimar nuvens, jogar estilhaços pelos ares. Como pode carregar tanta munição nas costas? Furtivamente, fui roubando olhares. De amizades instauradas.

A fome do mundo, aos poucos, queimando a parede do estômago, enquanto sou alvejado centenas de vezes pela mesma arma. Aquele estouro; um barulho violento, como se eu mesmo fosse um balão desses de gás explodindo categorias e rispidez. E o problema maior nem eram as cicatrizes, ainda abertas, mas o sentido que as ruas haviam tomado. A casa velha com o grifo no lugar da torneira, as roupas empilhadas e toda aquela poeira se acumulando na parte de cima dos livros. Ah, mas eles estavam todos lá para ver o dia em que a pedra atravessaria a janela. Peças de quebra-cabeça espalhadas pelo chão. Tranquilo eu tomei dois comprimidos. Tinha ainda nos pulsos a marca do descontentamento com o mundo. Era chegada a hora. Uma fúria avassaladora. Contra o mundo. Contra tudo e todos, menores, pedintes, religiosos e filósofos. Eles mesmos poderiam ainda renunciar a minha vontade. Ansioso, eu tomei dois goles e levantei. Acendi um cigarro e deitei; tentei dormir e eles, meus inimigos todos, na cama comigo.

Me servindo de companhia.

Four things

Contava do Dr, pois assim o gostava de chamar, que estava interessado em literatura latina e que pouco a pouco começou a apreciar alguns autores alemães. Ainda assim, gostava pouco de poesia e mal sabia quem eram os grandes poetas de sua língua.
E por que eu comecei a contar os cigarros que fumo por dia? Antes, eu ligava somente para embalagens e outras coisas do cotidiano. Agora, conto. Pareço criança. Loucura. O doutor olhava de cima abaixo para dizer que mesmo os livros podem ser um indício de esquizôfrenia, mas que não era motivo de preocupação já que o tratamento estava indo muito bem. Eu deixei de lado os maços para poder sentir o gosto da minha boca e, sim, deixá-la livre para o gosto dele. Tentaram, há muito, me fazer largar o vício. E cada vez que o fizeram, mais afundei meu radicalismo para tudo. Hoje, eu paro pra ele. Para as suas reclamações constantes de moleque. E ele dizia que a mãe havia sumido sem dizer para onde ir e logo a sessão foi encerrada. No caminho de casa veio de forma agudas as lembranças. Como hoje eu acordei já com as primeiras palavras na boca e posso ter dito ao travesseiro confissões bobas. Posso ter dado a tudo o que fiz, um nome. Curto, pouco sibilado, como o corpo dele, um sentido de flores. O ar radicalmente seco e todo o resto dentro de mim pulsando alegrias e anseios. Quando criança, entrava em casa correndo de travessuras e dizia à mãe que havia jogado pedra no telhado do vizinho. Taciturna, calma, a mãe sábia dizia: - Mesmo? Pois eu tenho uma novidade para você -, e corria pegar a cinta.
Mas é assim que se começam os dias. Drummond disse poeticamente "se acordas e se deitas pensando...". Hoje, aqueles velhos estudos se transformaram em matéria morta. Eu, corroído pelo desejo, anseio somente poemas eróticos. Procuro encardenar minhas palavras e logo estou com o corpo dele em cima de mim. Sou movido, como poucos, pelo desejo. Pela carne, pelos caminhos da pele suave e branca. E encarno, crucificado, ele dentro de mim. Passo as tardes assim: pulsando adrenalinas e experimentando numa louca irrealidade, o gosto dele. Passo, sem pormenores, de uma viagem a outra. Sem perceber, eu sou fundido. Torno-me a própria irrealidade. Ele, me pulsando alegrias e gozos, deitados na cama, ele me virando para o outro lado.
O doutor na semana seguinte parecia misterioso como se tivesse descoberto a cura para todos os problemas dele. Olhou e se pôs a falar: eu me lembrei semana passada Dela. Será que enfim eu vou poder entender o que houve?