Sunday, August 10, 2008

Conto.

Encostou-se na árvore, como se está estivesse erguida para o seu corpo cansado. Esteve por horas andando a esmo. Segurou-se em muitos pensamentos, olhou o rio, notou que os peixes descansavam sob a sombra projetada pela imensa árvore. Devia ser algo secular, pensou. O dia estava quente, demasiadamente sufocante, como tudo aquilo que havia dito na noite anterior. Era como se as palavras pudessem assumir uma forma corpórea e se misturassem ao dia, ao sol, ao calor e aqueles pássaros que sobrevoavam também sem rumo. Segurou as mãos na tentativa de imaginar que fosse outra mão e não a sua própria. E ali, naquele tronco, encostado pensou que poderia resolver todos os seus problemas. Era falta, que na imaginação modificava-se como presente. Todas as recordações lhe vinham como ondas gigantes de cenas, choques, espantos e sonhos irrealizáveis. Com o dia agitado, tendo acordado cedo, sentiu que naquele lugar um mundo estava se formando; a cada lágrima, uma criação e a cada suspiro um desmoronamento. Por que não escrever poesia, interrogou-se já quase deitado na grama. A poesia poderia de certa forma, colorir e preencher algumas formas tão vazias dentro de si. O telefone poderia tocar a qualquer instante com uma notícia vinda de longe e eu poderia mudar-me para o interior, para alguma cidadezinha com poucos habitantes e viver só, do trabalho e do corpo. A realidade era somente aquele momento, que bem poderia ser a felicidade, já que acreditava que a felicidade era apenas um segundo em que o corpo se desprendia da alma. Lá fora, ouvia o barulho ressonante e grave dos carros.

Os pés doíam. O calor com o atrito do tecido áspero do sapato provocaram bolhas no canto do pé e na sola cansada. Tirou o sapato e quase como um ato religiosamente sagrado, encostou o pé na terra úmida. Era um alívio, como se a terra estivesse lhe retribuindo um favor. Seus pés se misturaram aquilo que lhe afagava o corpo inteiro. Imaginou, já maravilhado com a quietude daquele momento, que enfim chegaria ao céu e encontraria um pedaço de terra com uma árvore de tronco grosso e forte para deitar-se na eternidade, pois aquilo já era um pedaço do sentir-se para sempre. Em verdade, não poderia sentir-se de outra maneira.
Uma voz lhe dizia que o caminho era aquele mesmo. Já nem mais pensava nos carros, no barulho e na fumaça vinda do asfalto quente. Mesmo que houvesse uma passeata política lá fora, jamais tiraria seus pés da terra úmida. Estava misturando-se, aos poucos, àquele lugar. Poderia morar ali. Poderia casar-se, plantar e jamais ter que encontrar outro lugar para descansar.

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