As viradas de ano são engraçadas. Tudo aquilo que deveria ter um gosto de simplicidade, se transformando em grandes questões metafísicas. Ou talvez seja apenas eu que espero de mim e do mundo, execessos e excessos. Não dá pra levar nada a sério. O ano que começa já cansado, os dias arrastados pela mesmice e o que fazer quando tudo o que resta é o final de semana? A espera pelo depósito do salário, pequenos momentos de emoção, noites e noites e só mesmo as amizades para salvar a chatice que é mais um novo ano. Difiícl encontrar o paradeiro daquilo que se programou, daquilo que se tentou fazer e não deu certo. E mesmo as promessas pagãs não foram cumpridas. Junto com o ano, começar a contagem regressiva para os trinta, o peso dos trinta. Nas costas, ainda os antigos problemas, becos sem saída, velhos hábitos e toda aquela porcaria que por vezes não conseguimos nos desvenciliar. Vai ser difícil fazer trinta e ver que pouco daquilo que se sonhou foi realmente conquistado. As vezes a melhor maneira de realizar um sonho é acordar, ainda que o lugar onde se esteja sonhando não é o mesmo que se planejou. O príncipe encantado, que nem era tão encantado assim não veio, os poemas se perderam em formatações, falas e mais falas esquecidas. Que chatice é começar um novo ano. Nada mais parece tão simples. A urgência de executar, às pressas, os deveres e direitos. Ser um bom cidadão, ser uma pessoa melhor, colher mais frutos, reler alguns livros importantes, tentar e tentar. E não cessa aquela antiga preguiça da vida, mesmo quando tudo parece já ter acontecido, de bom e ruim, o melhor parece ser aquele sonho distante, um sonho onde tudo fosse diferente do que foi; dores apagadas, uma outra história, outra infância, outro tipo de sofrimento e novas histórias de almoços de domingo com a família. Mas já eu já havia sido alertado de que aquilo que não dói no início, dói no fim. Não, não é pessimismo, muito menos pretensão de ser um niilista. Realidade e mais realidade. Uma dureza capaz de esmagar a simplicidade das coisas. Cada ano parece ter o seu roteiro. Para este, esqueci de colocar as frases, ou talvez nem tenha querido descobrí-las nessa antecedência apressada. Mas a vida cobra, com direito a papel timbrado e aviso telefônico. O que resta é encarar a chatice, a mesmice, o ordinário de cada dia e viver.
Quem sabe um dia, os dias, o dia, passe devegar, realizados naquilo que conquistamos aos poucos, sementes e alegrias. Talvez, talvez, um dia isso tudo deixe de ser chato, fazer trinta seja bastante alegre e aos quarenta eu leia isso e dê risada. Ou o avesso.